“Na medida em que você ouve e as pessoas participam, mesmo que não seja a decisão que aquele colaborador estava envolvido ou alinhado, quando ele participa do processo de discussão ele vai compreender o que está por trás. No final, não só a decisão é mais sólida, mas a equipe vai estar junto”, afirma Eduardo Saron, CEO e presidente da Fundação Itaú. “Entender o processo, às vezes, é mais importante do que entender a decisão em si”, assinala.
Saron é o convidado do podcast “CBN Professional”, uma parceria do jornal Valor com a rádio CBN. Toda segunda-feira, um novo episódio está disponível no site da CBN, no YouTube do Valor e em todos os tocadores de podcast como Spotify e Apple Podcasts. Neste episódio, o executivo, que foi do movimento estudantil, participou da gestão pública no governo do Estado de São Paulo na gestão de Mário Covas e no governo federal na gestão de Fernando Henrique Cardoso, conta como essas experiências aprimoraram sua habilidade de escuta. “A possibilidade de ouvir várias versões, vários entendimentos, as várias percepções que as pessoas trazem para a mesa é central, eu estava diante de muitos olhares”, lembra. “Não são só as palavras, mas as entrelinhas.”
Há três anos, ele comanda a Fundação Itaú, com mais de 300 funcionários, e que, apenas em 2024, investiu quase R$ 300 milhões em ações de cultura, arte e educação. Saron acredita que o ingrediente mais importante para quem ocupa um cargo de liderança, em qualquer lugar, é saber se comunicar. “O seu ouvido precisa estar muito apurado, muito qualificado, é como aprender uma língua. Se não tiver um bom ouvido, você vai ter sempre dificuldade de se comunicar naquela língua”, diz. “E se você não sabe ouvir, muito provavelmente seu processo de comunicação não é efetivo ou é autoritário.”
Durante 15 anos, Saron comandou o Itaú Cultural e nesse tempo diz que procurou criar pontes entre as várias linguagens artísticas, geografias e gerações. “Não há nada mais poderoso do que a pluralidade desse Brasil que é profundamente diverso nas pessoas que vivem aqui, nas questões econômicas, inclusive olhando as questões de concentração de renda e a profunda desigualdade”, observa. “Se a gente não compreender o país a partir dessa pluralidade, a gente não consegue se movimentar de maneira adequada para colocar luz no melhor do Brasil, que é a sua potência artística”, afirma.
Sob a gestão da Fundação Itaú estão o Itaú Social, Itaú Cultural e Itaú Educação e Trabalho. Saron lembra o dia em que, ainda no comando do Itaú Cultural, recebeu um telefonema de Alfredo Setubal, presidente do conselho curador da Fundação Itaú. “Eu estava viajando de férias e perguntei se era algo urgente e ele disse que podia marcar uma reunião quando eu voltasse”, diz.
No dia do encontro, ele foi recebido por Setubal e as duas vice-presidentes da Fundação Itaú, Neca Setubal e Ana Lucia Vilela. “Pensei comigo, bom, para mandar embora não vai ser porque não se chama três pessoas para mandar embora. O RH também não estava junto”, diverte-se.
Na época, o cargo de presidente da Fundação Itaú estava vago, porque Fábio Barbosa havia saído para comandar a Natura &Co. Saron recebeu então oficialmente o convite para se tornar CEO e presidente da fundação. “Fiquei muito emocionado e não respondi. Eu não esperava”, conta. Então, ele lembra que Setubal perguntou: “mas você topa?”, e ele respondeu: “você tem dúvida?”. Naquele momento, ele conta que tomou sua primeira decisão no novo cargo. “Eu conhecia muito de cultura, mas muito pouco de educação, então decidi correr atrás”.
Foram dois meses de conversas com pessoas do ecossistema e do governo. “Fiz mais de 60 entrevistas, perguntando: o que você está fazendo na sua organização? Quais são os desafios? Onde estão tendo problema no mundo da educação?”, recorda. Ele repetia sempre as mesmas perguntas em busca de evidências para então poder criar um cenário. E foi ouvindo as diferentes perspectivas que ele decidiu reposicionar o Itaú Social. “O terceiro setor se dedica muito pouco ao ensino fundamental dois, o antigo ginásio”, diz. “A matemática é um problema gravíssimo. De cada 100 alunos que terminam o ensino médio, apenas cinco sabem matemática adequada ao último ano”. Diante desse quadro, o Itaú Social passou a fazer uma série de ações no mundo da matemática.
Internamente, a Fundação Itaú na gestão de Saron passou também a oferecer incentivos a pós-graduação stricto sensu e programas de formação em inteligência artificial para os funcionários.
“A inteligência artificial é muito mais que uma ferramenta, um instrumento, é uma tecnologia de propósito geral, que são aquelas descobertas que não interferem só no modo de produção, mas no nosso modo de vida e de construir o nosso conhecimento, na forma de a gente se relacionar”, diz. “E ela adiciona um ingrediente a mais, a velocidade”.
Diante dessa grande mudança em curso, Saron reforça a importância da matemática entre as habilidades necessárias para hoje e para o futuro. “Se você não dominar a matemática, seu pensamento analítico vai ficar fragilizado. O Pisa [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes] mostrou que 30% da criatividade vem do pensamento lógico”, observa. Ao mesmo tempo, ele acredita que nunca a arte e a cultura foram tão importantes para a educação. “O pensamento crítico, a capacidade adaptativa, viver de modo mais colaborativo, são elementos que estão muito ancorados no campo da arte e da cultura.”
No episódio, Saron fala ainda sobre os modelos de trabalho e sobre como construir e transformar uma cultura organizacional.