Leonardo Porto, Thais Ortega e Paulo Lopes: Impactos das tarifas e como reduzi-los

Desde o início do ano, as tarifas de importação nos Estados Unidos subiram, em média, para 18% até agosto de 2025 (ante 2,5% em 2024), atingindo os patamares mais elevados desde os anos 1930, de acordo com o time de economistas do Citi. Uma das consequências imediatas desta observação será o encarecimento significativo das importações implicando em concomitante redução do comércio com a maior economia do planeta. Mas quais outros impactos a redução do comércio trará para as economias globais?

Sabemos desde o século 19 que o comércio permite a ampliação do mercado consumidor, permitindo que as economias especializem sua produção onde tenham “vantagens comparativas”. Este processo de alocação dos fatores de produção (trabalho e capital) em setores mais eficientes apoiaria um maior crescimento da produtividade que, “no longo prazo, é quase tudo” para o desenvolvimento econômico de qualquer nação.

Evidências empíricas utilizando técnicas econométricas apropriadas encontradas no final do século passado corroboraram a intuição de que mais comércio eleva a renda dos países. Em adição, estudo posterior que avaliou os impactos da elevação das tarifas do aço nos EUA no início deste século encontrou redução do emprego industrial naquela economia, em especial nas indústrias que utilizam o aço como insumo de produção (automobilística por exemplo).

Com relação aos preços, outro estudo mostrou que a alta das tarifas de importação contra produtos chineses aplicadas pelos EUA entre 2018-2019 foi em quase sua totalidade paga pelas firmas e consumidores norte-americanos. Em resumo, encontrar racionalidade econômica na decisão de elevar as tarifas de importação não é uma tarefa trivial diante de tantas evidências empíricas que mostram impactos deletérios sobre crescimento e os preços domésticos.

E o que dizer sobre os impactos sobre a economia brasileira? Primeiramente, a elevação das tarifas de importação nos EUA sobre os produtos brasileiros foi bem mais significativa (as tarifas se elevaram para 50%) do que para a média dos demais países. Mesmo após incorporarmos a isenção do adicional tarifário sobre cerca de 45% dos produtos, nossa estimativa para a alíquota média sobre os produtos brasileiros vendidos nos EUA é de cerca de 32%, portanto bem acima dos 18% aplicados, em média, sobre os demais países.

Assumindo a manutenção das tarifas por 12 meses e utilizando parâmetros da literatura acima descrita calculamos que os produtos brasileiros deverão tornar-se cerca de 38% mais caros nos EUA, implicando em uma queda de cerca de 45% na sua demanda. Esta menor demanda se traduzirá em uma redução nas exportações brasileiras em cerca de 3% (US$ 10 bilhões), consequentemente subtraindo o PIB em cerca de 0,5 pontos percentuais ao longo de 12 meses.

Importante salientar que tais impactos sobre a economia brasileira referem-se apenas ao efeito direto sobre o comércio, especificamente sobre as exportações brasileiras. Desta forma, potenciais efeitos do aumento tarifário dos EUA sobre as outras economias e destas se propagando para o Brasil, bem como realocações das exportações brasileiras para outros países, ou mesmo os efeitos de políticas mitigadoras contidas no recém anunciado “Plano Brasil Soberano” não foram contemplados em nossas estimativas.

Produtos brasileiros deverão ficar cerca de 38% mais caros nos EUA, implicando queda de cerca de 45% na sua demanda.

Esta menor demanda se traduzirá em redução nas exportações de cerca de 3% (US$ 10 bilhões), tirando 0,5 ponto percentual do PIB

Diante deste diagnóstico, fica a mensagem que o aumento das tarifas de importação pelos EUA se assemelha a um choque de oferta adverso para aquela economia e um choque de demanda negativo para os demais países com ambos os efeitos deprimindo as perspectivas de expansão da economia global nos próximos trimestres. Se adicionarmos ao menor crescimento global a maior incerteza do cenário prospectivo temos um ingrediente adicional para inferirmos uma provável menor propensão à tomada de riscos por parte dos investidores globais, potencialmente restringindo os fluxos de capitais para países emergentes como o Brasil.

Dito tudo isto, o que podemos fazer para nos protegermos (ou ao menos mitigarmos) os impactos de um ambiente global provavelmente mais adverso nos próximos meses? Não há dúvida de que a fragilidade dos fundamentos fiscais da economia brasileira (nível e dinâmica da dívida pública) é o principal ponto de preocupação dos investidores, sobretudo diante de um ambiente de taxas de juros mais elevadas tanto domesticamente quanto globalmente. Desta forma, enfraquecer as restrições legislativas (meta de resultado primário, limites de crescimento das despesas públicas, Lei de Responsabilidade Fiscal, etc) que buscam uma consolidação fiscal, ainda que pouco ambiciosa, é caminhar na direção contrária da melhora dos fundamentos fiscais, consequentemente elevando nossa vulnerabilidade ao ambiente global mais adverso. Além disto, e assim como já comentado, eventuais retaliações que impliquem elevação das tarifas de importação no Brasil não encontram respaldo no campo da racionalidade econômica, uma vez que estaríamos apenas importando o choque de oferta adverso para a nossa economia.

Ou seja, dizendo de uma forma mais assertiva, diante de um crescimento econômico robusto nos últimos 4 anos com sintomas inequívocos de uma economia sobreaquecida operando muito próximo do pleno emprego (taxa de desemprego na mínima histórica, salários elevando cerca de 9%, inflação acima do teto da meta) torna-se imperativo ambicionarmos uma consolidação fiscal mais acelerada bem como um plano mais agressivo de reduções tarifárias/não tarifárias das nossas importações para que o país perpetue o atual ciclo de expansão. Evidentemente que ambas as tarefas dependem, fundamentalmente, de competentes negociações, sejam junto ao Congresso Nacional (no plano fiscal) sejam aquelas conduzidas pelo Ministério das Relações Exteriores (no plano comercial).

*Autores:

Leonardo Porto é economista-chefe do Citi Brasil.

Paulo Lopes e Thais Ortega são economistas do Citi.

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