A aplicação de inteligência artificial (IA) no agronegócio está redefinindo a forma de produzir alimentos, gerir recursos e enfrentar desafios climáticos. Ao antecipar surtos de pragas, otimizar o uso de insumos e operar máquinas de forma autônoma, a IA aumenta a produtividade e reduz custos, criando um modelo agrícola mais sustentável e adaptado às exigências do século XXI.
Num cenário global em que será preciso alimentar quase 10 bilhões de pessoas até 2050, a tecnologia deixa de ser apenas uma vantagem competitiva para se tornar elemento central da segurança alimentar e da resiliência das cadeias de produção.
Esse avanço não é isolado, ele reflete um movimento global de expansão acelerada. O mercado de IA aplicada à agricultura deve crescer de US$ 1,7 bilhão em 2023 para US$ 4,7 bilhões em 2028, segundo a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Esse crescimento acompanha uma verdadeira corrida tecnológica, em que a inovação é sistematicamente protegida por patentes.
Dados da OMPI mostram que, nos últimos anos, os depósitos de patentes em agricultura de precisão, automação e robótica têm crescido acima de 10% ao ano, enquanto as patentes em modelos preditivos, que apoiam decisões estratégicas no campo, registraram aumento médio de 27% ao ano entre 2017 e 2021.
Esses números revelam que, além de transformar práticas agrícolas, a IA está remodelando o próprio ecossistema de inovação, criando novos patamares tecnológicos e oportunidades de mercado para quem lidera a proteção intelectual.
Nesse cenário mapeado pela OMPI, a liderança está nas mãos de grandes corporações globais que combinam tradição no setor agrícola com investimentos em tecnologia.
Fabricantes internacionais de máquinas agrícolas acumulam centenas de famílias de patentes em dispositivos autônomos de precisão e em modelos computacionais integrados a equipamentos, já convertidos em soluções como tratores com piloto automático avançado, pulverizadores com visão computacional e colheitadeiras robotizadas.
Multinacionais do setor químico também avançam nesse campo, aplicando inteligência artificial para otimizar a proteção de cultivos, prever safras e detectar doenças em plantas, apoiadas em plataformas digitais voltadas à agricultura de precisão. Esses movimentos ilustram a convergência entre engenharia mecânica, automação e análise de dados, consolidando a IA como núcleo das estratégias de inovação agrícola em escala global.
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O Brasil, protagonista global na produção de alimentos, começa a ocupar espaço relevante nesse cenário. Dados da OMPI indicam que o país responde por centenas de famílias de patentes internacionais em dispositivos agrícolas autônomos e modelos preditivos. Ainda assim, 90% dos pedidos no Brasil são de origem estrangeira, o que demonstra que a inovação local ainda tem espaço para crescer.
A vantagem competitiva brasileira está na capacidade de adaptar soluções a áreas de cultivo de grande extensão contínua, como lavouras de soja e cana com milhares de hectares, realidade destacada nos dados da OMPI sobre a adoção de IA em culturas extensivas ainda presentes no país.
Esse contexto difere de outros polos agrícolas, incluindo os Estados Unidos, onde as grandes propriedades estão mais distribuídas e fragmentadas geograficamente, o que leva a ajustes técnicos distintos para a aplicação de tecnologias de IA.
O ecossistema nacional de inovação no agro se consolidou como um dos mais dinâmicos do mundo. O mapeamento Radar Agtech Brasil identifica mais de 1.500 startups ativas no país, distribuídas em áreas que vão da gestão de propriedades e automação de processos à agricultura de precisão e uso avançado de dados.
Muitas dessas empresas têm a inteligência artificial como núcleo tecnológico, desenvolvendo soluções que permitem desde a predição de safras e monitoramento climático até a detecção precoce de pragas e a otimização do uso de insumos.
Em paralelo, a Embrapa mantém um papel estruturante na pesquisa aplicada e na difusão de tecnologias, atuando como elo entre ciência, empresas e produtores, o que tem sido determinante para que inovações cheguem ao campo de forma adaptada às condições brasileiras.
Especialistas do setor apontam 2025 como um marco para a consolidação da IA no agronegócio, com potencial para transformar processos da pesquisa à colheita e gerar ganhos expressivos de produtividade e sustentabilidade.
A corrida global, liderada por grandes corporações com extensos portfólios de patentes, mostra que a inovação tecnológica e a proteção por propriedade intelectual são determinantes para capturar valor nesse setor.
Para que o Brasil avance de um papel predominantemente importador para se tornar também criador e exportador de soluções AgriTech, será fundamental investir em P&D, fortalecer parcerias entre universidades, empresas e produtores e utilizar de forma estratégica o sistema de PI.
A inteligência artificial no agro não é apenas uma ferramenta, mas um ativo estratégico para garantir a competitividade e a sustentabilidade do agronegócio brasileiro nas próximas décadas.
*Valdir Bhering é especialista de patentes da Daniel Advogados