Finalmente, trens vão rodar na Transnordestina

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Depois de quase 20 anos de obras intermitentes, promessas não cumpridas e muito atrito político, a ferrovia Transnordestina vai finalmente receber os primeiros trens em operação comercial a partir deste mês de outubro. Ainda é uma operação tímida, quase irrisória, perto do volume de cargas que a ferrovia deve transportar quando em operação completa, o que só deve acontecer em cerca de dois anos. Ainda assim, é um marco importante de um dos maiores projetos de infraestrutura do país, cujo desenho inicial foi traçado pelo imperador Dom Pedro II no distante século XIX e que teve suas obras iniciadas apenas em 2006, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Agora não tem mais volta, todos os agentes ligados ao projeto estão focados em sua conclusão, os recursos estão garantidos, em 2027 as obras da Transnordestina acabam”, diz o otimista Tufi Daher, presidente da Transnordestina Logística, a subsidiária da CSN que toca as obras e vai explorar a ferrovia pelos próximos 30 anos.

A Transnordestina é um desses emblemáticos projetos de infraestrutura brasileira que atrasam, consomem mais recursos do que o planejado e são alvos de permanentes disputas políticas. Projetada para ligar o interior do Piauí aos portos de Pecém, no Ceará, e de Suape, em Pernambuco, seu principal objetivo era escoar a crescente produção de grãos da região conhecida como Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), a nova fronteira agrícola que se expandia pelo Cerrado brasileiro no início dos anos 2000. No caminho inverso, as composições deveriam trazer insumos para as áreas de produção agrícola e máquinas, equipamentos e combustíveis para uma esperada industrialização do sertão nordestino. Seriam 1.728 km de trilhos, passando por 80 cidades do Piauí, Pernambuco e Ceará, a um custo de R$ 4,5 bilhões. A expectativa era de que a obra, uma das maiores do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado por Lula em seu primeiro mandato, estaria concluída em 2011.

Mas nada disso aconteceu. Ao longo dos anos, disputas políticas, contingências orçamentárias e desistências transformaram o traçado da ferrovia, atrasaram as obras em mais de 15 anos e fizeram o orçamento inicial triplicar. Neste momento, não há previsão de a Transnordestina chegar ao Porto de Suape, em Pernambuco – a CSN desistiu desse trecho – e seu traçado final, nesta fase, encolheu para 1,2 mil km, ligando a cidade de Eliseu Martins, no Piauí, ao Porto de Pecém, na área metropolitana de Fortaleza. Mesmo sem o trecho de 600 km que deveria cortar parte do sertão e agreste de Pernambuco até Suape, o custo total da obra vai chegar a R$ 15 bilhões.

“Essa é a primeira vez que todos os intervenientes públicos estão pensando da mesma maneira. Antes, quando três ou quatro questionavam alguma coisa ou não atuavam em sintonia com a obra, você paralisava toda a engrenagem. Foi o que aconteceu ao longo dos anos”, diz Tufi Daher.

Até agora, a Transnordestina já tem 600 quilômetros prontos para serem operados, entre as cidades de Paes Landim, no Piauí, e Acopiara, no Ceará. Apesar das obras aceleradas, ainda falta contratar cerca de 100 km, o que, segundo a empresa, deve ocorrer neste próximo mês de outubro. No entanto, para a CSN, 75% das obras já estão concluídas. Isso acontece porque a parte mais sensível para a construção da ferrovia está exatamente nas obras de infraestrutura, como pontes, viadutos e, o mais importante, o nivelamento do trecho.

“Uma ferrovia pode ter uma elevação de apenas 1,5 grau, é muito diferente de uma rodovia, que pode subir e descer morros sem muito problema. Aqui não pode haver essa inclinação”, conta Jocemar Caprini, gerente geral de obras da Transnordestina Logística, um capixaba que nos últimos anos tem se dedicado a construir ferrovias em diferentes partes do Brasil.

Neste momento, os mais de 4 mil homens que trabalham na Transnordestina estão dedicados exatamente à preparação do terreno para receber os dormentes e os trilhos, a parte final na construção de uma obra como essa. Sob o sol inclemente do sertão cearense, eles erguem pontes, fazem a terraplanagem do terreno e detonam muitas rochas.

“Essa área é caracterizada exatamente pelos afloramentos rochosos, é um desafio porque precisamos fazer todos os dias ao menos seis detonações”, conta Caprini, que teve uma experiência bastante diferente na duplicação da Estrada de Ferro dos Carajás, em meio à Floresta Amazônica. Além disso, diz ele, há uma escassez de mão de obra na região por conta dos investimentos privados que estão chegando junto com a ferrovia.

Em Quixeramobim, Airton Carneiro espera ansioso a ferrovia e, principalmente, o terminal intermodal que está sendo construído na cidade e que deve se tornar um importante porto seco ao longo da Transnordestina. Dono de uma fábrica de rações que atende a bacia leiteira do interior cearense há 70 anos, Carneiro diz que está produzindo muito menos do que poderia por conta das dificuldades logísticas e de armazenamento. Por dia, mais de 20 carretas chegam a sua fábrica trazendo 500 toneladas de caroço de algodão, milho, farelo de soja e sorgo que serão transformados em alimento para os bovinos e caprinos da região. “Eu não acho que o frete vai mudar tanto assim, mas o volume e a previsibilidade, combinado com um espaço maior de armazenamento, devem ampliar minha produção em ao menos 50%”, diz ele.

As obras do terminal ainda estão começando e a expectativa é que fiquem prontas até meados do ano que vem. O governo federal está liberando linhas de crédito de R$ 1 bilhão para as empresas que queiram investir numa área de 360 hectares.

Numa segunda fase, a partir de 2027, estrutura alfandegária será instalada no terminal para que o desembaraço possa ser feito localmente, tanto para importação quanto para exportação. “A gente já vê um aumento na especulação imobiliária, mas é só o começo, a cidade vai crescer muito com esse terminal”, afirma Carneiro, animado com o ritmo das obras, mas sempre com um pé atrás depois de tantas promessas e tantos atrasos.

Neste mês de outubro os trens ainda não chegarão em Quixeramobim. A fase de testes, ou fase comissionada, como dizem os ferroviários, vai ligar um trecho pequeno e pouca carga será transportada. Pela estimativa da CSN, num primeiro momento serão movimentadas entre 10 mil e 15 mil toneladas entre São Miguel do Fidalgo, no Piauí, até Iguatu, no Ceará, transportando basicamente grãos para abastecer a bacia leiteira do sertão cearense.

“Mas isso é muito experimental, em 2028 a gente já quer estar transportando 4 milhões de toneladas e não só de grãos, assim como fertilizantes, minério, enfim, uma grande diversificação”, diz o presidente da Transnordestina. De acordo com Daher, a expectativa é de que em 2030 esse volume já tenha pulado para 20 milhões de toneladas.

O executivo diz que não há nenhum contratempo à vista, nem mesmo as eleições presidenciais de 2026, que prometem ser bastante acirradas em um cenário cada vez mais polarizado. “Eu tenho certeza que, independentemente de quem estiver no Planalto em 2027, nós vamos concluir essa obra, ela não para mais”, afirma.

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