Transnordestina: Devolução de 3 mil km é desafio para repactuação no TCU

A proposta de repactuação do contrato da FTL (Ferrovia Transnordestina Logística) negociada no TCU (Tribunal de Contas da União) prevê a devolução da maior parte da malha originalmente concedida em 1997. Hoje sem operações, três mil quilômetros sairão do contrato, caso haja aprovação do tribunal, de um total de 4,2 mil quilômetros da concessão – preservado o trecho que conecta o Porto de Itaqui (MA) ao Porto de Mucuripe (CE), que será requalificado. Entre indenização e investimentos na FTL, a renegociação do contrato gira em torno de R$ 3,1 bilhões.

O número expressivo de trechos devolvidos levanta questões entre diferentes agentes do setor sobre a destinação final da malha, que hoje atravessa sete estados no Nordeste. Para além da discussão sobre a definição exata do cálculo de indenização, técnicos do TCU e usuários defendem que haja um plano de ação muito bem definido sobre o que será feito dos trilhos, sob pena de a infraestrutura virar um “fardo” para o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes).

O debate, reforçaram diferentes agentes, não é se os trechos devem ou não ser devolvidos, já que a inviabilidade dessa malha já foi constatada por diversas instâncias – mas sim sobre a cobrança para que a destinação esteja bem azeitada, o que o governo e a concessionária afirmam estar garantido nas tratativas.

O assunto vai crescer no segmento ferroviário em função de outras negociações que também vão prever uma devolução relevante de malha, como é o caso da FCA (Ferrovia Centro Atlântica), cuja prorrogação do contrato está em análise na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) para ser enviada ao TCU. Somando as malhas não operacionais da FCA, da FTL e da Malha Sul, operada pela Rumo, são cerca de dez mil quilômetros de trilhos que poderão ser devolvidos no curto prazo.

A expectativa do Ministério dos Transportes é que fique pronto no início do próximo ano um estudo em que o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) foi contratado para avaliar o que pode ser feito com essas extensões. No caso da FTL, a pasta também destaca que, na malha Nordeste, outros projetos já estão sendo executados ou estudados, inclusive para trechos que são coincidentes a uma parcela que será devolvida pela concessionária. Segundo o secretário Nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro, os investimentos totais podem chegar a R$ 40 bilhões, resultando em 3,6 mil quilômetros operacionais (veja detalhes mais abaixo).

Destinação para municípios e custos

A FTL separa os três mil quilômetros que serão devolvidos em três grandes grupos. Um é de trechos coincidentes com a nova malha que a TLSA – também da CSN – está construindo, conhecida como Nova Transnordestina, e de projetos que o governo pretende tocar. A concessão da TLSA liga Eliseu Martins (PI) ao Complexo Industrial e Portuário de Pecém (CE), em pouco mais de 1,2 mil quilômetros de trilhos greenfield. (leia na reportagem abaixo aprovação da ANTT sobre essa concessão).

Outro grupo da devolução é composto por mais de 500 quilômetros que foram destruídos por enchentes ao longo dos anos e não são mais viáveis. O terceiro é composto por trechos que já foram recebidos pela FTL em estado degradado.

A proposta desenhada pela concessionária sugere a transferência das infraestruturas que precisarão ter alguma nova destinação para os municípios, com diferentes tipos de uso. O diagnóstico da empresa identificou 164 cidades interceptadas por essa malha a ser devolvida, 33 apenas de área rural e 131 em região urbana. A maior parte (117) está em cidades com menos de 200 mil habitantes.

Para cada tipo de município, a FLT sugere usos específicos. Em centros urbanos maiores, por exemplo, há previsão de VLTs e ampliação de sistemas de passageiros que já são administrados pela CBTU e o Metrofor, por exemplo. No caso dos menores, que são maioria, é proposto que a área seja transformada em parques e ciclovias, entre outras destinações que não são de cunho logístico. As informações foram compartilhadas durante painel de referência sobre a repactuação da ferrovia, realizado pelo TCU nesta quarta-feira (8).

Um dos pontos em debate na comissão de renegociação, contudo, é quem paga pelo descomissionamento e a retirada das superestruturas nos casos em que os trilhos e dormentes precisarão ser removidos das cidades. Isso porque a IN (Instrução Normativa) do DNIT que trata do cálculo de indenização não deixa claro se essas operações são incluídas no escopo dos passivos ambientais, o que tem gerado uma discussão sobre quem deve arcar com esses custos.

O ponto foi levantado pelo auditor da AudPortoFerrovia, Geovaldo Oliveira. Segundo ele, para retirada do trilho e transporte, o custo pode girar em torno de R$ 50 mil por quilômetro. “A depender da destinação, isso vai gerar um custo para o ente que receber. O DNIT já trouxe entendimento que isso deveria ser a cargo do operador ferroviário, mas me parece que isso está em aberto”, observou Oliveira, para quem a decisão sobre a destinação ainda não possui um processo estruturado.

Ribeiro, da secretaria de Ferrovias, argumentou que o ministério está debruçado sobre a política pública dessas devoluções, trabalhando em diversas frentes, como de chamamentos públicos. Ele também citou a expectativa da conclusão do estudo que será entregue pelo BID.

“No caso da Malha Nordeste, estamos pensando em uma remodelação, com basicamente um T deitado, que é Eliseu-Salgueiro-Pecém, com ligação de Salgueiro ao Porto de Suape, fazendo a ligação com a Transnordestina. E o chamamento público vai ter papel fundamental para testar a vocação logística [dos trechos devolvidos]. E aí termos condição de erradicar trechos para ciclovias e outros desenhos que não sejam logística ferroviária”, afirmou Ribeiro.

Diretor-Presidente da FTL, Tufi Daher afirmou que a proposta da concessionária sobre a devolução dos trechos é “muito consistente” e chamou atenção para a inviabilidade econômica dessa malha atualmente. Embora seja a segunda concessão mais extensa do país, o transporte de cargas é relativamente pequeno, de três milhões de toneladas por ano, contra, por exemplo, 220 milhões de toneladas carregadas pela MRS.

“E somos o único grupo empresarial que está construindo uma nova ferrovia de R$ 15 bilhões. Eu tenho convicção absoluta que o melhor para o Nordeste é entregarmos uma nova ferrovia”, afirmou Daher, destacando também a remodelação do trecho que será mantido na FTL.

Diante do debate sobre o ‘Day after’ da destinação dos trechos, o diretor-presidente da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários), Davi Barreto, pediu que haja “noção da urgência e do pragmatismo” sobre as futuras decisões. “A gente não pode se esconder atrás dessa dificuldade da decisão para não tomar a decisão. A visão pragmática é super importante, de saber que essa que alguns trechos vão ser extintos de fato”, afirmou.

Mais debates na comissão

A comissão de solução consensual da FTL funciona desde julho e o prazo final para as negociações acaba em um mês. Entre outros assuntos discutidos – mas que não foram abordados durante o painel, dedicado a tratar dos trechos para devolução – está, por exemplo, o cronograma de investimentos, segundo apurou a reportagem, e um discussões sobre o ramal de Itaqui. Dos R$ 3,1 bilhões inicialmente imaginados para a repactuação, R$ 1,7 bilhão são oriundos da indenização pela devolução de trechos e R$ 1,4 bilhão são investimentos da FTL.

O valor da indenização, no caso deste ativo, é calculado a partir de um mix da IN do DNIT e do contrato de concessão. Isso porque a FTL é a única concessão que foi repassada à iniciativa privada com um diagnóstico específico sobre o estado da malha. Dessa forma, a avaliação da empresa é que não seria possível aplicar de forma genérica a estimativa feita pelo DNIT.

Investimentos na região

Já os R$ 40 bilhões calculados pelo Ministério dos Transportes para a região se referem a uma soma de investimentos de projetos em estágios diversos. Em construção pela TSLA, o trecho Eliseu Martins a Pecém tem orçamento de R$ 15 bilhões; R$ 10 bilhões estão previstos no trecho Pernambuco; R$ 3,1 bilhões viriam da repactuação; e R$ 12 bilhões são projetados para a conexão da Transnordestina com a Norte-Sul – ainda em fase de estudos.

“Os 500 quilômetros de Pernambuco serão endereçados da seguinte forma. Haverá um termo de devolução para o poder público do trecho construído entre Salgueiro a Custódia, que o poder público terá que indenizar o investimento, e em outubro a Infra SA deve fazer licitação para o trecho entre Custódia e o Porto de Suape. Somando, aí são R$ 10 bilhões”, explicou Ribeiro.

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