
Cada vez mais países têm utilizado as chamadas políticas industriais para apoiar setores e empresas, em um esforço para remodelarem suas economias, afirma o Fundo Monetário Internacional (FMI) em capítulo recente da publicação Perspectiva Econômica Global (WEO, na sigla em inglês).
De acordo com o fundo, os subsídios industriais estão em alta desde 2009, com marcada aceleração a partir da pandemia de covid-19, sobretudo no setor de energia. Várias nações decidiram apoiar esse segmento para reduzir a dependência das importações de combustíveis fósseis e promover a transição energética.
Embora reconheça que intervenções do tipo visam ao aumento da produtividade, bem como a redução da dependência de insumos e suprimentos estrangeiros, o FMI alerta que a eficácia das políticas industriais depende de características sensíveis do setor contemplado com a ajuda governamental, características essas difíceis de determinar antecipadamente.
Além disso, se o governo decide que o país deve ser forte num dado segmento, precisa estar ciente de que tal iniciativa pode levar, por exemplo, a um período prolongado de preços mais altos ao consumidor, que é quem paga a conta da estratégia como um todo. Tradução: toda política industrial, por melhor que seja a intenção, embute riscos.
Esse contexto é especialmente relevante em uma era de países altamente endividados, com grandes desafios de ordem fiscal, caso do Brasil. Mas se a realidade de momento não basta para refrear a conhecida fixação dos governos petistas por conteúdo local, o passado recente oferece lições que o Brasil não deveria ignorar.
Nos anos 1970, tanto o Estado brasileiro quanto o sul-coreano adotaram políticas industriais de larga escala com o objetivo de transformar suas economias. Mas enquanto o Brasil focou primordialmente na substituição de importações, tendo o Estado como principal ator de tal estratégia, a Coreia do Sul adotou um caminho bem diferente.
O país asiático perseguiu um modelo exportador, com base nos chamados chaebols, grandes conglomerados industriais privados. Os conglomerados tinham de cumprir metas para manter o apoio estatal. Internamente, as fábricas competiam entre si, tentando fazer domesticamente versões ainda melhores do que vinha de fora.
Segundo a análise do FMI, as duas experiências revelam o papel crucial da boa modelagem de políticas industriais. No caso sul-coreano, as empresas privilegiaram a contratação de engenheiros, e não de burocratas. No chão de fábrica, sul-coreanos absorveram tecnologias estrangeiras, o que lhes permitiu desenvolver soluções domésticas.
O modelo sul-coreano voltado à exportação também permitiu às empresas do país ter acesso aos mercados globais, beneficiando-se de economias de escala.
No caso brasileiro, a política de substituição de importações tocada pelo Estado prescindiu do setor privado, aquele que na Coreia se beneficiou imensamente do processo de aprender fazendo. Voltado para si mesmo, sem metas ou supervisão, o Brasil desperdiçou oportunidades e dinheiro público.
Não por acaso, poucas décadas mais tarde, a Coreia do Sul converteu-se em um país desenvolvido, enquanto o Brasil, apesar de seu imenso potencial, segue sendo uma nação de status emergente. Enquanto os sul-coreanos produzem carros vendidos no mundo todo e equipamentos eletrônicos de alta inovação tecnológica, o Brasil continua a ser basicamente um grande exportador de commodities, de menor valor agregado.
Ser um grande fornecedor de grãos e minerais para o mundo não é demérito algum nem exclusividade brasileira. Mas países da estatura do Brasil não devem abdicar do seu potencial industrial, o que passa bem longe da distribuição de subsídios e benesses governamentais para os eleitos de sempre.
Em momento em que as tentações intervencionistas estão em alta mundo afora, o Brasil não precisa nem deve apostar naquilo que, como prova o passado, já deu errado. Como destaca o FMI, políticas industriais efetivas dependem de planejamento e implementação cuidadosos, instituições robustas, reformas estruturais complementares e política macroeconômica sólida.