Renovação de frota e economia circular é sonho ou necessidade?

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Falar de renovação da frota circulante no Brasil é um assunto complexo. Esse cenário se torna mais sensível quando pensamos nos setores de transporte e do agronegócio.

O assunto ganha ainda mais relevância por lidar com resultados que impactam toda a cadeia de negócios. Não é raro encontrar veículos e implementos defasados que comprometem a segurança, ampliam o custo de operação e trazem incertezas, não apenas à logística dos segmentos, como à própria subsistência dos operadores e motoristas.

Painel no #ABX2025 reuniu autoridades sobre o tema

Números e perspectivas para maior integração e renovação de frota do segmento de transporte foram debatidos durante o Automotive Business Experience – #ABX25.

O painel foi mediado por Daniela Giopato, editora da revista “O Carreteiro”; e teve as presenças de Arthur Rufino, CEO da Octa, empresa especialista em economia circular automotiva; Ariel Donegá e Silva, analista de pesquisa da S&P Global; e Leonardo Ianegitz, diretor de operações da Dekra no Brasil, líder global em serviços de inspeção e testes veiculares.

A renovação da frota atual para o setor agrícola foi abordada por Luis Vinha, sócio-diretor da consultoria [BIM]³ – Boschi Inteligência de Mercado, que divulgou em primeira mão o levantamento “Panorama Setorial de Máquinas Agrícolas no Brasil”.

Idade da frota circulante no Brasil preocupa

Dados do Sindipeças referentes à frota circulante em 2024 indicam que o Brasil tem 2,2 milhões de veículos comerciais pesados, além de outros 6,4 milhões de comerciais leves em circulação.

Por um lado, caminhões, ônibus e comerciais leves representaram apenas 14,6% da frota total no país. Por outro, são os veículos mais envelhecidos: 56% dos veículos pesados têm mais de 15 anos de idade. Destes, 32% tem de 15 a 20 anos, sem contar os 12% com intervalo de 20 a mais de 25 anos. No caso dos comerciais leves, 42% têm de 11 a 20 anos.

O levantamento da [BIM]³ para o setor do agro indica um total de 1,65 milhão de máquinas e implementos, sendo 1,35 milhão de tratores, 217 mil colheitadeiras e 82,5 mil pulverizadores.

A idade média da frota agrícola também preocupa. Mais de metade da frota supera a média de 15 anos de uso, sendo 18 anos para tratores, 10 anos para colheitadeiras e oito nos pulverizadores, em média.

Além da defasagem da frota, há a falta de integração digital na adoção de tecnologias mais atuais. Na estrada ou no campo, máquinário muito velho convive com outro extremamente novo, digital e caro. Estes demandam maior qualificação de motoristas e operadores. Há ainda o fato de que só 34% das propriedades rurais, que estão na ponta das cadeias logísticas, possuem acesso à internet.

O custo do envelhecimento da frota

Discutir a falta de existência de um programa eficiente de renovação de frota no país demanda olhar para múltiplos fatores e muitos atores que ainda não estão sentados à mesma mesa buscando uma solução, dizem os especialistas.

“(Renovação de frota no Brasil) é um problema sistêmico. Quando a gente olha o cenário, qual o momento do veículo está no final de vida, quando ele deveria sair de circulação, se existe ou não vistoria técnica veicular, se há incentivo (para renovação) ou desincentivo tributário para veículos mais antigos esse problema está longe de ser do transportador. Mas não é uma questão só do transportador, de vontade política e não é algo só do (trabalhador) autônomo. São diversas questões (que levam à defasagem da frota) e a solução dificilmente vai sair de um único ente”, afirmou Rufino, da Octa.

“É preciso ter em mente que muitas vezes esse motorista ou operador autônomo não está com caminhão anterior a 1999 porque ele gosta. Está porque é a ferramenta de trabalho que consegue manter”, afirmou Donegá e Silva, da S&P Global.

Pior: a falta de políticas sustentáveis de renovação da frota circulante que beneficiem também esse operador acabam inviabilizando a manutenção do trabalho. Isso também afeta cooperativas e associações, tudo por conta do Custo Total Operacional (TCO) elevadíssimo de caminhões e maquinários cada vez mais envelhecidos.

É um ciclo vicioso: mais velho, o equipamento tem custo de manutenção mais alto e limita o número de entregas a custo compatíveis. Com isso, o operador tem cada vez menos caixa e menos dinheiro livre no fim do mês, seja para manuetnção, conserto ou mesmo para subsistência. Esse prejuízo acaba indo também à cadeia de negócios desde a sua ponta.

“Quanto mais ele se afunda nessa questão do custo não fechar, ele também perde receita em potencia, porque pega fretes cada vez menores”, explicou Rufino, da Octo, que elencou ainda o problema do mercado de peças para veículos com mais de 10 ou 15 anos, de estoque extramemente volátil e com preços não lastreados.

“Quando você vê a realidade dessa turma, não está ganhando dinheiro, está trabalhando para pagar o diesel e a comida, no final do mês. O TCO desta turma é alarmante”, afirmou.

Brasil ainda engatinha na renovação da frota

Os palestrantes apontaram que, além de reforçar programas de incentivo, a própria estrutura que lida com a prática da renovação no mercado precisa ser ampliada. Atualmente ela é escassa e traz resultados mínimos.

Além do financiamento para unidades novas, linhas de crédito para veículos de segunda circulação, com idade intemediária entre 8 e 15 anos, poderiam ter impacto positivo no mercado.

Mas não basta definir programas e linhas de crédito. É preciso que os requisitos para ter acesso sejam realistas. Atualmente, o mesmo mercado que pode fazer críticas fortes para a falta de uma política concreta de renovação, não conseguiu ajudar operadores a acessarem quase R$ 1 bilhão em recursos da MP 1175/2023.

Criada em 5 de junho de 2023, pelo MDIC (Ministério da Indústria e Comércio) durante o primeiro ano do governo Lula, a MP 1175 foi um programa de incentivo à compra de veículos novos e mais sustentáveis. Concedia descontos tanto para pessoas físicas quanto jurídicas que entregassem veículos antigos (com mais de 20 anos), mas com total condição de rodar.

É difícil usar um termo pesado como “fracasso” quando se analisa um programa de incentivo, mas apenas R$ 320 milhões em créditos foram liberados – R$ 130 milhões para obtenção de caminhões, outros R$ 190 milhões para ônibus. Mas outros R$ 700 milhões ficaram inativos, sem distribuição.

Os especialistas classificam esse tipo de programa como “passo positivo”, mas isso não impede de elencar falhas.

“Aquele programa funcionava para montadoras e para transportadora pequena, média e grande, que pegava o crédito para tirar o caminhão encostado e pegar um novo. Mas para o autônomo não funcionava, porque dava um benefício de X, enquanto o caminhão novo custava 10X”, disse Donegá e Silva.

Os especialistas concordam ainda que qualquer programa de fomento deve focar não apenas na compra de veículos e maquinários zero-quilômetro, mas também em faixas e datas-limites, para que veículos em piores condições sejam trocados por outros em melhor estado, “reduzindo a disparidade entre o veículo novo e aquele que precisa ser sucateado”, completou o executivo.

Vinha, da Boschi Inteligência de Mercado, aponta que, além da renovação gradual, contemplar formas diferentes de utilização, como locação e leasing, seriam fundamentais. Até porque 55% dos operadores ouvidos no levantamento têm planos de compra de novos equipamentos nos próximos anos. Esse volume varia de 11% a até quase 40%, dependendo do tipo de máquina.

Também no pós-venda de serviços e de peças haveria espaço para utilização de incentivos, seja por troca de créditos por insumos e peças, bem como por serviços de inspeções e certificações para modelos que entram em recirculação – algo não contemplado pela MP de 2023, que expirou sem se tornar lei.

“Com mais acesso a veículos, implementos e máquinas mais novos, gradualmente, efeitos positivos seriam replicados ao longo da cadeia”, afirmou Ianegitz, da Dekra.

E aí, a ideia de circulo virtuoso – ou de economia circular – poderia dar frutos no Brasil.

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