
A necessidade de se adaptar à cadeia de valor automotiva diante de um momento de instabilidade e disrupções sem precedentes foi o principal tema abordado no painel “Resiliência para a cadeia de valor automotiva em tempos de instabilidade”, do palco Automotive Now, durante o #ABX25 – Automotive Business Experience.
Ao abrir o painel, o professor da Fundação Getúlio Vargas, Antonio Jorge Martins, destacou os principais obstáculos pelos quais o setor automotivo passa.
Entre eles, a rápida transição para um ambiente digital complexo, incertezas e instabilidades globais, necessidade de autonomia financeira das subsidiárias, demanda por novas lideranças e culturas organizacionais alinhadas às empresas digitais, além do aumento da competitividade para enfrentar esses desafios.
Mudança logística é a mais grave da história
Para Sérgio Tanibata, diretor de negócios da Timbro, a disrupção logística é a mais grave que ele já viu na história. Ele comparou a situação atual, que é mais lenta e contínua, com mudanças semanais em regras tarifárias, políticas cambiais e macroeconômicas, com a disrupção repentina da pandemia.
O contexto atual, de acordo com Rodrigo Curiacos Custodio, diretor da Troesser&Co nas Américas, é sem precedentes, com complexidades logísticas, regulatórias, tarifárias e a evolução tecnológica do veículo, que exige que as empresas saibam lidar com veículos a combustão, híbridos e elétricos ao mesmo tempo.
“É importante controlar os seus processos internos, a organização, a governança, a organização, a liderança, a cultura, os processos, a tecnologia, os parceiros com quem você trabalha. Tudo isso com o objetivo de construir uma empresa mais resiliente possível. E o primeiro passo para isso é aumentar a lucratividade, a geração de caixa para passar por períodos de instabilidade”, destacou.
Uma pesquisa da FT Longitude apontou uma relação de causa e efeito, conforme mencionou Ricardo Carvalho, diretor de produto regional da Maersk.
“Foram entrevistadas 950 empresas no mundo todo, inclusive da América Latina, especificamente do setor automotivo. E encontraram um número interessante: a falta de resiliência traz uma perda de receita líquida da ordem de 4,7%.”
Carvalho sugeriu três pilares para a resiliência: pessoas, parceiros e tecnologia, destacando o uso de modelos preditivos para prever problemas.
O choque entre a tendência de migração da eficiência (“just-in-time”) para a resiliência (“just-in-case”) e a pressão das matrizes por resultados foi lembrada por Elmar Gans, managing partner da Mirow & Co.
Ele propôs a melhoria dos processos de Sales and Operations Planning (S&OP) e o uso de uma supply chain management mais analítica e com tecnologia para ter uma “torre de controle” e evitar redundâncias desnecessárias.
A urgência da geração de caixa
A discussão então se voltou para a necessidade de gerar caixa continuamente. Gans destacou que com juros altos e problemas em outros mercados, a geração de caixa se torna a prioridade número 1.
Ele citou a gestão inteligente de estoques de peças, a otimização de pedidos e a resolução de materiais obsoletos como formas de liberar capital e encurtar o ciclo de giro.
Muitas empresas negligenciam a cadeia de suprimentos como uma área estratégica, focando apenas em custos, “o que é uma visão míope”, disse Carvalho. Ele ressaltou que a eficiência e o planejamento estratégico são essenciais para gerar caixa.
A geração de caixa não é apenas para a resiliência, mas também para investir em tecnologia e aproveitar oportunidades de mercado, como comprar empresas que enfrentam dificuldades, ressaltou Custodio.
Os efeitos da atual situação, contudo, só serão sentidos daqui a 18 meses, e que este período será crucial, podendo levar ao fechamento de montadoras tradicionais, afirmou Tanibata.
“Serão períodos muito difíceis. A caixa de empresas grandes, principalmente de montadoras, vai drenar para poder sobreviver a essa fase. Por exemplo, caso da Porsche, da Volkswagen na China, eles estão perdendo, no geral, 65% do mercado mundial deles. Só tem como criar planos de contingência e melhorar o que puder na estrutura.”
Estratégias de curto prazo
Para encerrar, o professor Martins propôs um exercício, diante de um cenário hipotético e desafiador. O que aqueles executivos fariam se assumissem a diretoria de uma empresa e tivessem que responder a uma questão central e urgente: como aumentar a competitividade “para amanhã”, ou seja, no curto prazo?
Tanibata sugeriu colocar o melhor executivo na China para “sobreviver” nos próximos três a cinco anos, isolando os resultados daquele mercado e recriando a empresa.
Custodio destacou que pessoas e cultura são transversais e um investimento na qualificação de líderes é crucial para melhores decisões.
Carvalho, por sua vez, defendeu a necessidade de sair do “status quo”, ter mais criatividade, inovação e foco no cliente. E Gans sugeriu que a diretoria trabalhe em conjunto, fora de seus escritórios, com reuniões semanais com as “cabeças mais brilhantes da empresa” para tomar decisões rápidas, evitando processos lentos.
Em um cenário de incertezas, os executivos concordaram que o caminho para a resiliência no setor automotivo passa, fundamentalmente, pelas pessoas. Investir na mudança cultural, desenvolver líderes qualificados e promover uma colaboração mais próxima entre as equipes são passos essenciais para tomar decisões rápidas e estratégicas.
Em um mundo em constante transformação e cheio de mudanças inesperadas, a capacidade de se adaptar e inovar – em todos os níveis – é o que realmente garante a sustentabilidade de toda a cadeia de valor.