Irmãos Batista, Daniel Vorcaro, Lucas Kallas: quem são os novos personagens da mineração brasileira

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A mineração de ferro no Brasil, tradicionalmente dominada pela Vale, grupos familiares e algumas siderúrgicas, vem atraindo investidores de outras atividades nos últimos anos. É um setor que, em geral, tem margens de ganho altas, preços médios estabilizados no mercado internacional na faixa de US$ 110 por tonelada, valor do produto atrelado ao dólar, demanda global crescente por minério de alto teor para descarbonização do aço e oportunidades de crescer com consolidação de ativos.

Os entrantes nesse negócio vão de empresários do setor financeiro e de seguros a grupos com atuação no agronegócio, silvicultura, ferro-gusa, construção e incorporação imobiliária até quem começou fazendo recuperação de rejeitos de barragens para pequenas mineradoras. Quatro exemplos ilustram essa trajetória de novos nomes na produção de minério de ferro.

O banqueiro Daniel Dantas, dono do Grupo Opportunity, criou seu braço de mineração em 2007, quando fundou a Bemisa (Brasil Exploração Mineral S/A). Outro banqueiro, Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, viu a oportunidade de entrar nesse setor, entre outros negócios, ao liderar, em 2024, a compra do controle da Itaminas, junto com dois sócios, por cerca de R$ 1,5 bilhão.

O grupo J&F, dos irmãos Joesley Batista e Wesley Batista, que controla a gigante de proteína animal JBS, estreou em 2022 ao adquirir ativos da Vale em Mato Grosso do Sul. Lucas Kallas, fundador da Cedro Mineração, está no setor há cerca de uma década e se posicionou comprando pequenas minas e arrendando direitos minerários.

Cada um deles está longe de se transformar numa Vale, que prevê produzir neste ano cerca de 330 milhões de toneladas do produto. Mas já surgem como grupos de médio para grande porte na atividade, com planos de serem players de expressão no mercado doméstico e se tornando uma alternativa de fornecimento para alguns mercados no exterior.

Conjuntamente, já fazem em torno de 30 milhões de toneladas. Todavia, seus projetos de expansão indicam 65 milhões de toneladas até 2030.

Para Rafael Marchi, diretor e especialista de mineração da Alvarez & Marsal, margens altas do negócio, de 40% a 50%, alta geração de caixa e venda em dólar da commodity são fatores de atração. Por isso, diz, muitos grupos enxergaram na produção de minério de ferro uma oportunidade de diversificar seus negócios, como são os casos de J&F, Opportunity e de Daniel Vorcaro.

Segundo Marchi, a entrada desses investidores traz capital e nova gestão. “A compra da Itaminas pelas famílias Gontijo, Géo e Vorcaro foi uma oportunidade de diversificação, assumindo uma empresa que estava em situação financeira complicada”, diz.

O especialista observa, no entanto, que há grandes desafios para quem pretende investir: o setor requer capital intensivo, acesso a logística (ferrovia e portos) e também a mercados no exterior para não ficarem dependentes de vendas só no mercado interno – que em geral são feitas para a Vale, Gerdau, CSN Mineração e produtores de ferro-gusa.

Como o setor passa por uma fase boa, com preços que tiveram forte alta desde 2019, quando a Vale sofreu o impacto do rompimento da barragem de rejeitos de Brumadinho (MG), surgem algumas oportunidades. Mas têm sido raras. “Margens acima de 30% não são de se jogar fora” comenta Wilson Brumer, ex-presidente de Vale, BHP Billiton Brasil e Usiminas, conselheiro de empresas e consultor de negócios na mineração. Para ele, ao atingirem capacidades de produção de 10 milhões para cima, os novatos começam a ganhar maior presença internacional, desde que equacionem a logística para exportação.

A atratividade do minério de ferro vem da lucratividade e da resiliência do preço verificada nos últimos anos, diz José Carlos Martins, ex-diretor de ferrosos da Vale, consultor e conselheiro daCedro Participações. Ele acrescenta que, com os acidentes verificados em Mariana (2015, na mina da Samarco) e Brumadinho, o Brasil vem produzindo muito abaixo do seu potencial, abrindo oportunidade a produtores não tradicionais. “Alguns dos novos entrantes apenas substituíram antigos proprietários de minas já existentes”, diz.

Consolidar pequenas produtoras familiares, que apenas em Minas são mais de duas dezenas na região do Quadrilátero Ferrífero, não é uma tarefa fácil, avaliam especialistas, Com os preços no patamar atual, acima de US$ 100, há encarecimento das transações. “Muitas dessas empresas começaram prestando serviços a grandes mineradoras. No boom de preços ganharam muito dinheiro e aí se criou uma zona de conforto”, comenta Brumer. As fusões e aquisições, na maioria dos casos, destaca Marchi, vão depender da saída do dono ou de seus herdeiros darem continuidade ao negócio,

Os planos da J&F

Nos últimos anos, a mineração entrou no foco do grupo gigante controlado pelos irmãos Batista, além das áreas de energia e petróleo e gás. Os ativos adquiridos da Vale três anos atrás, na região de Corumbá, por US$ 1,2 bilhão (incluindo dívidas), não tinha escala para a mineradora: produzia menos de 3 milhões de toneladas ao ano e tinha uma logística ao mercado difícil. Um grande atrativo era a reserva mineral grande associada a minério de alta qualidade — teor de 66% de ferro.

Segundo informações obtidas pelo Estadão, com os investimentos já realizados, a LHG Mining – nome da empresa criada para gerir a operação — já elevou a capacidade de produção para o nível de 12 milhões de toneladas. “Saímos de 2 milhões para esse patamar”, afirma um interlocutor do grupo. Procurada, a J&F não concedeu entrevista.

Conforme dados da revista especializada Brasil Mineral, no ano passado a LHG produziu 8,5 milhões de toneladas nas minas Santa Cruz e Urucum. O plano da mineradora dos Batista, conduzida pelo sobrinho Aguinaldo Ramos Filho, presidente da J&F e CEO da mineradora, é alcançar 25 milhões de toneladas até 2030.

O negócio era pequeno para a Vale e, pelo retorno gerado, perdia qualquer disputa de investimento com a mina de Carajás (no Pará) e outras operações em Minas Gerais. A avaliação no setor é que um ativo como esse, embora com as dificuldades de logística — uso de barcaças pelos rios Paraguai e Paraná até Nueva Palmira, no Uruguai, enfrentando riscos de baixo calado em épocas de estiagem — é uma “noiva” cobiçada, tanto que houve disputa pelo ativo. Mas para uma das “Big Five” (Vale, Rio Tinto, BHP, Fortescue e Anglo American), provavelmente, não seria atrativo.

Na J&F, o que justifica a expansão é o crescimento da demanda mundial por insumo de elevado teor de ferro na fabricação de aço, com menor geração de carbono (CO2). A projeção de investimentos é da ordem de R$ 8 bilhões – metade na ampliação das minas e unidade de beneficiamento e outro tanto no sistema de transporte.

Em setembro de 2024, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)aprovou financiamento de R$ 3,7 bilhões para a LHG Logística, para a construção de 400 balsas e 15 empurradores. O objetivo era modernizar e expandir a logística de transporte hidroviário de minério de ferro e manganês pelos rios Paraguai e Paraná.

A ambição da Cedro

Com duas minas em operação em Minas Gerais — uma em Nova Lima e outra em Mariana —, o grupo Cedro, do empresário Lucas Kallas, tem um plano ambicioso de se tornar um grande produtor de minério de ferro do País até o final desta década. “A partir da conclusão do nosso Porto em Itaguaí, em 2029, pretendemos frequentar diretamente o mercado internacional. Pretendemos chegar a uma produção superior a 20 milhões de toneladas a partir de 2030”, diz o conselheiro da holding que controla a Cedro Mineração, José Carlos Martins.

Segundo o executivo, a empresa está expandindo a produção no limite dos recursos minerais que dispõe e também em função do acordo que fez com a Vale, de arrendamento de reservas vizinhas em Mariana (MG) para produção de pellet-feed (minério de alto teor). “Nosso objetivo é vender minério para siderúrgicas locais e também exportar, indiretamente, através dos outros grandes mineradores, como Vale e CSN”, diz. Com as expansões e porto próprio, vislumbra também exportar diretamente no futuro.

Martins diz que a Cedro tem novos projetos sendo desenvolvidos, novos acordos para explorar recursos existentes, a exemplo do que foi feito em Mariana com Vale, ou mesmo com aquisições de reservas ainda não colocadas em exploração por atuais proprietários. A Cedro, com a Vale, vem ainda avaliando a possível aquisição da Bahia Mineração (Bamin), mas o negócio enfrenta uma série de entraves, em especial devido ao investimento muito elevado.

O foco da empresa é a produção de pellet-feed de alta qualidade, agregando mais investimentos e tecnologia, diz o executivo. Para ele, mineração é uma atividade extrativa e de baixo valor agregado. “A descarbonização da indústria siderúrgica vai requerer cada vez minérios mais puros e de maior qualidade, que terão que ser beneficiados através de investimentos maciços em tecnologia de ponta e equipamento de última geração. Essa é a base da estratégia de crescimento da Cedro, aproveitando a tendência mundial de descarbonização da indústria do aço”, afirma.

Nova gestão e novos planos na Itaminas

Após uma longa crise, com dívidas fiscais e tributárias, a Itaminas, fundada em 1958 pela família de Bernardo Paz (criador do museu a céu aberto Inhotim), foi vendida a três empresários mineiros em julho do ano passado. O negócio foi liderado pelo banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, por meio de um fundo de investimento.

Os sócios do banqueiro assumiram 50% do capital acionário da mineradora. São as tradicionais famílias mineiras Géo (Argeu Lima Géo e quatro filhos) e Valadares Gontijo (três herdeiros). Os Gontijo já atuam no setor com a AVG, empresa dona de uma mina de ferro de pequeno porte e uma siderúrgica de ferro-gusa, ambas em Minas Gerais.

Com a mudança de controle, a Itaminas ganhou nova gestão, liderada por Thiago Toscano, que está à frente de um plano de investimentos de R$ 1,5 bilhão até 2033. De lá para cá, o foco é aumento de produção, com minério de alto teor, modernização das instalações e um novo terminal de embarque. Ao mesmo tempo, a empresa firmou contrato com o Porto Sudeste, no litoral do Rio de Janeiro, inicialmente para embarcar 4 milhões de toneladas ao exterior. O volume dobrou, e o prazo do contrato passou de 10 anos para 20 anos.

Informações de mercado dão conta que Vorcaro decidiu vender a sua participação aos sócios devido aos problemas enfrentados pelo Master. A notícia da mudança societária, porém, não foi confirmada nem pelo empresário, nem pelos sócios, tampouco pela Itaminas.

O objetivo da empresa é exportar diretamente para mercados no Oriente Médio (Omã e Emirados Árabes) e para a China, além de vender parte da produção a clientes do Brasil – com Vale e CSN tem contratos de venda de longo prazo. “Acabamos de ampliar um acordo com um parceiro de Abu Dhabi, a Hafeet Rail, de longo prazo, para ser um fornecedor de minério de alto teor a clientes da região”, disse ao Estadão o executivo, que chegou de Riad neste sábado, 25. O objetivo é expandir a capacidade de escoamento e fortalecer a posição da mineradora no mercado internacional.

Toscano informa que neste ano a empresa tem um cronograma de enviar 12 navios, cada um apto a carregar 180 mil toneladas, a maioria com destino à China. O despacho das 2,2 milhões de toneladas, desde Sarzedo (MG), onde ficam as minas e unidades de beneficiamento da empresa, se dá pela ferrovia da MRS e pelo Porto Sudeste. Em 2025, a mineradora prevê produzir 8 milhões de toneladas, passando a 10 milhões no próximo ano.

O plano de crescimento da Itaminas passa também pelo arrendamento no início do ano da Mina Jangada, da Vale, situada em Brumadinho, próxima das suas reservas. O contrato é de 15 anos, podendo ser renovado, e a Vale tem preferência na compra do material extraído e processado. Para suportar os investimentos, no momento os sócios da mineradora estão fechando uma nova rodada de captação de recursos financeiros.

Com isso, a empresa espera, a partir de 2033, estar produzindo 15 milhões de toneladas por ano. Desse volume, 70% de minério tipo pellet-feed, com teor de 65,5 a 67% de ferro, que é utilizado na fabricação de pelotas de redução direta. Esse material premium de ferro tem preço na faixa de US$ 180 a tonelada. O produto commodity, sinter-feed, de 62%, é cotado na China, atualmente, próximo de US$ 110. Em 2021, o preço atingiu o dobro desse valor.

Bemisa abre nova mina

A mineradora do Opportunity, que opera as minas Baratinha e Mongais no município de Antônio Dias (MG), tem plano um plano de investimento de R$ 100 milhões para montar uma nova operação, Pedra Branca, em João Monlevade. Com a nova mina, vai elevar a capacidade de produção em 50%, para 6 milhões de toneladas por ano, de acordo com a revista Brasil Mineral. Procurado, o Opportunity não se pronunciou sobre o assunto.

O plano de Dantas para esse negócio, que inclui a mina de ouro Água Azul, no Pará, era mais ambicioso. O empresário detém direitos minerários no sudeste do Piauí para montar uma mina de grande porte. O entrave é a logística de escoamento. Ele cogitou construir trecho de uma ferrovia até o Porto de Suape (PE), onde embarcaria o minério, mas o plano não avançou e desistiu em 2023.

Informações apontaram na época que a produção anual seria acima de 20 milhões de toneladas de minério de ferro, pois as reservas piauienses do Projeto Planalto eram estimadas em mais de 1 bilhão de toneladas.

Uma alternativa futura para salvar o projeto é aguardar que a ferrovia Transnordestina, em construção pela CSN com grande aporte de recursos públicos, seja finalizada. A nova previsão é 2028. O traçado, no entanto, mudou: sai de Elilseu Martins (PI), corta parte de Pernambuco, até Salgueiro, e daí sobe em direção ao Ceará, chegando ao Porto de Pecém.

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