
Quarta geração da família Gerdau, nascido no Rio de Janeiro, Jorge Gerdau, ex-CEO da siderúrgica Gerdau, é hoje um dos empresários mais influentes do Brasil. Com 88 anos, foi um dos principais responsáveis por transformar a companhia, uma antiga fábrica de pregos de Porto Alegre, em uma das maiores produtoras de aço do Brasil, que obteve lucro líquido de R$ 1,1 bilhão no terceiro trimestre de 2025.
Aos 14 anos, Jorge Gerdau já trabalhava na empresa da família, operando máquinas, convivendo com os funcionários e auxiliando no escritório com a emissão de notas fiscais. Em 1983, assumiu a presidência da empresa, buscando, ao lado dos irmãos, transformar a companhia em uma multinacional. Alguns anos depois, iniciou a expansão internacional com a aquisição da primeira fábrica no Canadá. Iniciativas como a entrada no segmento de aço especializado, a expansão para países como a Argentina e a listagem da empresa na Bolsa de Nova York contribuíram para que a companhia se tornasse uma das maiores siderúrgicas do Brasil.
Longe da presidência da Gerdau desde 2007, Jorge continua sendo um dos principais representantes do empresariado brasileiro. Presidente do Conselho Consultivo do Movimento Brasil Competitivo, ele se mantém atento ao momento econômico do país e mostra preocupação com os rumos para o próximo ano, mas enxerga positivamente as mudanças que virão com a reforma tributária.
Escolhido para receber o prêmio de empreendedorismo Antônio Proost Rodovalho, uma condecoração concedida anualmente pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Gerdau conta, em entrevista ao Diário do Comércio, suas expectativas sobre a reforma tributária e seus temores em relação à economia brasileira. Confira:
Diário do Comércio: A Gerdau é uma das maiores siderúrgicas do Brasil. Como ela atingiu esse patamar?
Jorge Gerdau: O meu pai era inspetor geral do banco alemão Deutsche Bank e cuidava de toda a inspeção da América Latina, Portugal e Espanha, por isso, ele tinha uma visão global muito interessante. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, passamos a ter dificuldade em encontrar matéria-prima para a fábrica de pregos da família. Então, surgiu a oportunidade de adquirirmos uma usina de produção de aço. Embora a fábrica de pregos vendesse para todo o Brasil, a matéria-prima era importada e havia uma certa limitação geográfica por conta disso. Quando surgiu essa oportunidade, tivemos a chance de ter nossa própria matéria-prima, desenvolvendo no Brasil todo. Entretanto, como era um sistema à base da reciclagem de sucata, havia certa limitação, o que nos fez expandir outras usinas em outros estados e países, e crescemos de maneira acentuada, com o apoio do mercado de capitais.
Como nossos concorrentes eram extremamente fortes, contavam com apoio do governo brasileiro por serem empresas estatais – que depois vieram a ser privatizadas -, isso motivou a expansão da Gerdau para o mundo, e começamos a comprar pequenas usinas no Canadá, nos Estados Unidos e em países sul-americanos. Fortalecer a nossa presença na América do Norte, principalmente nos Estados Unidos, nos levou a ter uma capacidade produtiva entre 10 e 15 milhões de toneladas. Depois, tivemos a compra da Açominas (em 1997), uma aquisição estratégica para a expansão.
O senhor acredita que a Reforma Tributária pode melhorar o ambiente competitivo do setor siderúrgico no Brasil?
Gerdau – Sim. Hoje, no setor siderúrgico, a carga tributária e os encargos globais giram em torno de 15% a 16%, o que engloba os impostos sobre energia, logística e encargos sobre a folha de pagamento. O novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado) é um passo importante para a redução da carga. Mas o Brasil ainda precisa se ajustar aos padrões internacionais de competitividade, estamos 20 anos atrasados nisso.
O fator importante é que foi criado o IVA, que é um sistema usado nos países desenvolvidos há anos. A França foi um dos primeiros a usar, cerca de quatro anos após a criação do ICM no Brasil (na década de 1960). O que preocupa é que nos países desenvolvidos a alíquota desse imposto fica entre 20% e 21%, e no Brasil, por ter feito uma série de concessões e dado privilégios a alguns setores, já está em 26%. É um assunto complexo, que está em debate, mas é estranho que um novo imposto já nasça com sobrecustos. Vamos ver o que vai acontecer na realidade, mas existe uma lógica conceitual de que o novo sistema de arrecadação não deve gerar aumento de carga tributária.
Qual é a sua leitura atual da economia brasileira? E quais são suas perspectivas para o próximo ano?
Gerdau – Nós estamos vivendo um momento interessante e favorável de forma geral, que supera um pouco as expectativas, com o aumento do consumo. Mas o impacto das mudanças estruturais fiscal e tributária ainda não conseguimos medir para a economia. Existe uma esperança de que o ritmo atual permaneça, mas, ao observar o terceiro trimestre, tivemos um crescimento de 0,1% do PIB, e isso nos deixa preocupados sobre como o governo federal está equilibrando gastos e receitas, e como isso pode afetar a economia.
É complexo definir como será 2026, porque é estranha uma expectativa próxima de 2% para o próximo ano, mas no último trimestre crescemos apenas 0,1%. Isso me preocupa, precisamos ver se é ou não um número apenas momentâneo, uma vez que se trata de um trimestre bastante favorável para a economia, já que é um período de investimento, de crescimento de produção para o final do ano. Se olharmos as estatísticas do passado, normalmente tem sido um trimestre de crescimento, mas este ano foi extremamente fraco. É preciso analisar se isso é algo fora da curva ou se estamos entrando em uma fase na qual, pelos aumentos de custos da estrutura pública, isso irá afetar a economia.
Qual a sua percepção sobre o tarifaço de Donald Trump?
Gerdau – Para a Gerdau, que quase não exporta para os Estados Unidos, não é problema. Agora, de forma global, afeta bastante o setor de aço e é uma preocupação enorme por ser um fator de desequilíbrio do setor siderúrgico. Outros setores tiveram produtos liberados da sobretaxa, mas o setor de aço continua sendo afetado e com o debate travado.
O que significa ganhar o prêmio Proost Rodovalho?
Gerdau – É uma honra ser distinguido por essa premiação. A própria origem de Proost Rodovalho, que historicamente foi um dos propulsores da produtividade e da educação, me deixa muito feliz em receber esse prêmio da Associação Comercial de São Paulo, que tem um posicionamento com o qual me identifico. A ACSP tem autenticidade por se autossustentar, sem dependência de recursos governamentais, e tem feito grandes trabalhos. Essa premiação caracteriza esse empenho na melhoria da produtividade. Tenho muito orgulho da entidade, que tem um posicionamento filosófico forte e trabalha uma visão de responsabilidade empresarial nesse sentido.
SOBRE O PRÊMIO
Criado em 1992 pela ACSP a pedido da Companhia Melhoramentos, o Prêmio Antônio Proost Rodovalho reconhece iniciativas de empresários que envolvem soluções criativas para problemas econômicos, sociais, políticos e relacionados ao meio ambiente. O prêmio recebe o nome do fundador da Melhoramentos e da ACSP. A homenagem ganhou a forma de um troféu que reproduz o busto do empreendedor Rodovalho, feito pelo escultor Luis Morrone.