Por Prof. Dr. Felipe Dalla Vecchia, diretor do Instituto do Petróleo e dos Recursos Naturais da PUCRS
A mobilidade sustentável é um conceito amplo que busca elevar a qualidade dos sistemas de transporte, ampliando acessibilidade, segurança, eficiência e conforto, ao mesmo tempo em que reduz emissões de CO₂, ruídos urbanos e outros impactos ambientais.
Quando o foco é a redução de gases de efeito estufa, estima-se que estratégias de mobilidade sustentável possam reduzir entre 15% e 21% das emissões globais, evidenciando seu papel na transição climática.
Nesse cenário, a eletrificação tem sido apontada como o caminho inicial para tornar o transporte mais sustentável. Veículos elétricos oferecem ganhos expressivos em eficiência energética, reduzem ruído e praticamente eliminam emissões diretas quando comparados a motores a combustão. No transporte coletivo, ainda melhoram a qualidade do serviço e a experiência dos usuários.
Por outro lado, a estratégia deve ir além da simples substituição tecnológica. Os principais desafios incluem custos de investimento e operação, maturidade e complexidade dos sistemas, disponibilidade de materiais e insumos, entre outros. A eletrificação em larga escala, por exemplo, depende de minerais críticos, produção massiva de baterias, veículos acessíveis, energia de baixa emissão e infraestrutura de recarga suficiente para atender à crescente demanda.
É por isso que a transição energética no transporte exige uma combinação equilibrada de soluções ao longo do tempo. Por exemplo, a ampliação do uso de biocombustíveis — biodiesel, etanol e biometano — pode expandir rapidamente o portfólio energético sem exigir mudanças profundas na cadeia tecnológica. Além disso, estratégias de hibridização, como etanol associado à propulsão elétrica, já mostram forte potencial no curto e médio prazo.
Em paralelo, os combustíveis sintéticos drop-in tendem a ganhar relevância. Produzidos a partir da combinação de hidrogênio de baixo carbono com biocombustíveis e/ou CO₂ capturado do ar ou de processos industriais, oferecem alternativas estratégicas para setores de difícil eletrificação, como a aviação (e-SAF e HEFA), os transportes de longas distâncias (e-diesel e HVO) e o transporte marítimo (e-MGO), sem mudanças profundas na infraestrutura de transporte e armazenamento, bem como na motorização dos veículos.
Diante disso, o caminho do sucesso passa pela criação de um portfólio diversificado de soluções, capaz de atender às demandas atuais e futuras e adaptada aos contextos locais e regionais. Nenhuma tecnologia, isoladamente, será ideal para todos os sistemas de transporte; a escolha mais sustentável dependerá da análise das condições e cenários de cada local. Só assim será possível construir sistemas de mobilidade mais eficientes, resilientes e com reduções reais e mensuráveis dos impactos ambientais — especialmente das emissões de gases de efeito estufa.
Por fim, o maior obstáculo à mobilidade sustentável no Brasil talvez não seja tecnológico, mas institucional: sem coordenação entre planejamento urbano, sistemas de transporte e infraestrutura energética, soluções eficientes podem perder escala, impacto e timming de implementação. Integrar essas três dimensões, aproveitando todo o portfólio de opções tecnológicas disponível, será fundamental para transformar metas climáticas em ações concretas, consistentes e duradouras.