
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) informou, nesta quinta-feira (18), que ingressou com uma Ação Civil Pública (ACP) contra a mineradora Sigma Lithium para a reparação de danos socioambientais causados pelas atividades da mina Grota do Cirilo, em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha. A ação foi proposta pela Promotoria de Justiça de Apoio Comunitário de Araçuaí, com apoio do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Apoio Comunitário, Inclusão e Mobilização Sociais (Cao-Cimos).
De acordo com o MPMG, o inquérito civil identificou impactos na qualidade do ar, na saúde, na convivência comunitária e no modo de vida das comunidades rurais de Piauí Poço Dantas, Ponte do Piauí e Santa Luzia, localizadas no entorno do empreendimento. Em caráter liminar, o órgão pede que a Justiça determine que a empresa tome várias providências para mitigar os danos causados à população, são elas:
Oferta de reassentamento aos moradores
Construção de uma nova estrada de acesso às residências próximas à mina
Custeio de programas de saúde
Suspensão de campanhas publicitárias que apresentem a empresa como sustentável
Contratação de auditoria para monitoramento da qualidade do ar, além de assessoria técnica independente para apoio jurídico às comunidades atingidas.
Ainda, o MPMG pediu a condenação da mineradora ao pagamento de indenização coletiva no valor de R$ 50 milhões. O órgão também solicita que a empresa arque com auditoria técnica externa e com a reparação de todos os danos ambientais e sociais que venham a ser constatados pela fiscalização. Outro pedido é a contratação de assessoria técnica independente para as famílias, a ser escolhida pelas próprias comunidades e custeada pela empresa, com o objetivo de garantir acesso à informação técnica e apoio à organização coletiva durante o processo de reparação.
A ação inclui ainda o pedido de indenização por danos individuais causados pelo empreendimento. Caso a ACP seja acolhida, a identificação e a valoração dos prejuízos deverão ser realizadas por perícia especializada independente, sem vínculo com a mineradora. O MPMG também requer a criação de programas de monitoramento da saúde e de desenvolvimento econômico das comunidades e o encerramento definitivo de campanhas publicitárias que, segundo o órgão, dissimulem uma suposta responsabilidade socioambiental da empresa.
Poluição sonora, ambiental e riscos a saúde
As apurações do MPMG envolveram visitas técnicas à mina e a 119 residências, análise de dados de monitoramento ambiental, fornecidos pela própria empresa, pesquisas quantitativas e qualitativas com 82 moradores e exame de documentos de órgãos públicos. Entre os principais impactos apontados estão a presença excessiva de poeira, poluição sonora, vibrações no solo decorrentes de explosões frequentes e restrições ao deslocamento das comunidades.
O inquérito indicou que 56% das famílias relataram alto teor de poeira no ar, percentual que aumenta conforme a proximidade das casas em relação à mina. Dados da mineradora analisados pelo MPMG mostram que os índices de material particulado fino ultrapassaram o limite anual em todos os pontos de monitoramento na média de 2023. “Embora a maioria das medições mensais esteja dentro dos padrões legais, a média anual excedida de forma recorrente revela um cenário de exposição contínua à poeira fina nas comunidades monitoradas”, observa o documento.
No caso do ruído, 100% das famílias ouvidas afirmaram perceber o barulho das explosões no cotidiano, sendo que sete em cada dez classificaram o som como alto ou muito alto, tanto durante o dia quanto à noite. Dados apresentados na ação indicam que, em 87,5% das medições noturnas realizadas em 2023, os níveis de ruído ultrapassaram os limites previstos em norma. Para o MPMG, essa situação compromete o direito ao repouso e ao descanso e afeta a saúde física e mental das pessoas atingidas.
As explosões também foram associadas a danos estruturais nas residências. Segundo o levantamento, cerca de 50% das casas do entorno apresentam rachaduras, com relatos de moradores sobre risco de desmoronamento em alguns imóveis.
Outro ponto crítico observado pelo estudo do MPMG foi de quatro famílias que moram no entorno da Grota Cirilo. Segundo a ação, os núcleos familiares estão com restrições de ir e vir, uma vez que precisam atravessar áreas internas do empreendimento minerário para acessar qualquer comunidade vizinha.
Com a expansão das operações, as residências teriam ficado cercadas por estruturas como pilhas de estéril, barragens, vias internas e áreas de lavra, restando como único acesso os caminhos controlados pela própria empresa.
Assim, o documento denuncia que o deslocamento para escola, trabalho, unidades de saúde, comércio ou visitas a parentes depende de autorização prévia da mineradora, que pode restringir a passagem por motivos operacionais, como detonações ou circulação de caminhões. O MPMG aponta que essa dinâmica também compromete a sociabilidade, uma vez que familiares e vizinhos deixaram de visitar as casas devido às exigências de identificação e às dificuldades de acesso.
Greenwashing
A investigação também analisou a comunicação institucional da empresa. Segundo o MPMG, apesar do histórico de violações de direitos, a mineradora adotou estratégia publicitária para se apresentar como ambientalmente responsável, com o objetivo de facilitar negociações com investidores. Para o promotor de Justiça Felipe Marques Salgado de Paiva, autor da ação, “esta prática de greenwashing constitui uma forma de desinformação ambiental que facilita a captação de investimentos e o licenciamento ambiental às custas da transferência dos custos socioambientais para as comunidades locais”.
O Diário do Comércio procurou a Sigma Lithium sobre a denúncia do MPMG e aguarda resposta.