
O Senado brasileiro avalia um projeto de lei para incentivar o processamento local de minerais críticos, principalmente terras raras, medida que pode gerar efeitos colaterais sobre o avanço de projetos no país.
A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou essa semana a proposta que cria a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos, com medidas para estimular o beneficiamento desses minérios internamente e assegurar o abastecimento futuro da indústria nacional.
“É preciso que haja uma política contínua e permanente de Estado para que esse objetivo seja alcançado, ou seja, favorecer e estimular aqui o beneficiamento dos minerais das terras-raras, que seja feito no Brasil”, disse o senador Esperidião Amin, do PP, relator do projeto.
O texto inclui uma emenda que prevê que, no mínimo, 80% do minério de terras raras seja processado e industrializado no país. Agora, a proposta segue para decisão final na Comissão de Infraestrutura (CI) do Senado.
A exigência de processar um volume elevado de terras raras no Brasil pode limitar o avanço de projetos no curto prazo.
“As técnicas de processamento de terras raras hoje são dominadas pela China, inclusive também em relação aos equipamentos necessários. Isso foi desenvolvido pela China ao longo de muitos anos, desde os anos 90 e com muito investimento. Para o Brasil desenvolver uma indústria local de processamento, levará anos e tem que ter, além de muito investimento, muito trabalho também com pesquisas e desenvolvimento”, disse José Carlos Martins, membro do conselho de administração da mineradora Cedro Mineração e fundador da consultoria de mineração Neelix á BNamericas.
Embora os minerais críticos sejam mais abrangentes, terras raras têm sido alvo de grande atenção no Brasil, à medida que o país conta com a segunda maior reserva do mundo, atrás apenas da China.
Recentemente, em meio às tensões comerciais entre as duas maiores economias globais, a China tentou limitar exportações de terras raras para os Estados Unidos, ressaltando a importância geopolítica do setor.
As limitações do Brasil para realizar processamento local no curto prazo já têm sido incorporadas nos planos de negócios das empresas com projetos no país.
A Aclara Resources, sediada em Toronto, planeja investir um total de US$1,2 bilhão (bi) em projetos de terras raras no Brasil, Chile e Estados Unidos.
No projeto Carina, no Brasil, a empresa investirá cerca de US$600 milhões, enquanto no módulo Penco, no Chile, serão cerca de US$150mi. Esses valores se referem à construção de minas e plantas de concentração que produzirão um concentrado de terras raras de alta pureza, com teores elevados de minerais pesados.
Após essa etapa, os concentrados serão enviados aos Estados Unidos para separação e produção de ligas. No Estados Unidos, a Aclara pretende investir US$350mi na construção de uma instalação de extração por solvente e outros US$130mi em uma planta para converter os óxidos obtidos nas ligas usadas em ímãs permanentes.
Algumas empresas com projetos no Brasil têm estudado opções para realizar o processamento no próprio país.
“No momento, o Brasil não tem capacidade industrial para o processamento – o chamado downstream. Estamos envolvidos com um projeto local chamado de MAG-BRAS, que trata da cadeia da mina ao ímã. Mais de 80% do consumo de terras raras vai para ímãs. Temos uma joint venture com a australiana Ionic, que possui tecnologia de reciclagem. Essa tecnologia é operada pela Viridium, nossa joint venture 50/50 com a Ionic. Planejamos instalar uma planta-piloto de reciclagem no Brasil no final do próximo ano, que processará ímãs descartados de motores e equipamentos, transformando-os novamente em óxidos de terras raras”, disse Klaus Petersen, chefe das operações brasileiras da australiana Viridis Mining, em entrevista recente à BNamericas.
A Viridis Mining desenvolve no Brasil o projeto Colossus, que tem capex estimado em US$358mi.
O MAG-BRAS mencionado pelo executivo é uma iniciativa estratégica do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (FUNDEP). A iniciativa reúne 38 empresas, startups, centros de inovação, instituições de pesquisa e universidades que atuam em diferentes elos da cadeia produtiva e busca consolidar a produção nacional de ímãs permanentes.
Outras Medidas
Além do processamento local, o projeto de lei discutido no Senado também prevê outras medidas para minerais críticos.
Segundo o Senado, a lista brasileira de minerais críticos e estratégicos será atualizada periodicamente pelo governo federal e orientará o uso de instrumentos de estímulo, incluindo zonas de processamento de transformação mineral (ZPTMs), incentivos fiscais e creditícios, financiamentos específicos, parcerias público-privadas e consórcios de pesquisa.
Incentivos fiscais têm sido defendidos por mineradoras voltadas aos minerais críticos, especialmente empresas juniores, que afirmam enfrentar dificuldade em captar recursos para projetos em estágios iniciais. Benefícios tributários tendem a aumentar a atratividade desses ativos para novos investidores.
A proposta do Senado também inclui cobre e minerais nucleares entre os estratégicos e estabelece regras de rastreabilidade da cadeia mineral, com informações sobre origem, volume e agentes envolvidos.