Como será o trabalho na nova era da ‘IA agêntica’?

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A nova era do trabalho exigirá menos execução e mais discernimento. Ao assumir tarefas repetitivas e complexas, a inteligência artificial irá redefinir o papel do humano no trabalho e potencializar o seu valor, já que as pessoas poderão se concentrar em interpretar informações, tomar decisões e inovar. Esse foi o consenso formado entre executivos e especialistas durante o Oracle AI World, evento que reuniu 16 mil pessoas de 152 países entre os dias 13 e 16 de outubro em Las Vegas, nos Estados Unidos.

“A IA muda tudo”, principal tema do encontro, marca o novo posicionamento adotado pela própria Oracle. Antes vista como um banco de dados tradicional, a gigante de tecnologia se apresenta agora como uma plataforma de nuvem e inteligência artificial orquestrada por um modelo de IA multimodal, capaz de entender, processar e gerar diferentes tipos de dados ao mesmo tempo.

Yvette Cameron, vice-presidente sênior de gestão de capital humano e marketing da Oracle, afirmou que estamos entrando na “era da IA agêntica”. “É aqui que a IA não apenas cria, mas age. Até então, vínhamos usando a IA generativa, que realmente nos ajudou a trabalhar mais rápido e de forma mais inteligente. Mas a IA agêntica vai muito mais longe, pois entende os objetivos, aprende com o contexto e age em nosso nome para que possamos ser liberados para nos concentrarmos no que realmente importa. Não se trata de substituir o potencial humano, mas de acelerá-lo”, destacou.

No entanto, segundo a especialista, os principais desafios permanecem. “Ainda precisamos desenvolver habilidades, contratar pessoas e desenvolver nossos líderes. Mas na era da IA agêntica, a complexidade, as expectativas e o ritmo da mudança são significativamente afetados porque ela é capaz de antecipar o que vem a seguir”, explica.

Uma das principais ferramentas dessa nova era são os “agentes de IA”, sistemas que funcionam como assistentes especializados para a execução de tarefas específicas. Em recursos humanos, por exemplo, eles podem enviar mensagens de acordo com o perfil do funcionário, atuar como coaches de carreira conectando habilidades, metas e aprendizado, ajudar líderes a gerenciar equipes, alinhar decisões e definir orçamentos, recomendar a função mais adequada para o perfil do profissional, identificar competências e lacunas de habilidades na força de trabalho, avaliar desempenhos, além de otimizar o recrutamento e auxiliar nas contratações.

Agentes de IA da área de saúde, por sua vez, podem fazer revisões de prontuários, dar suporte à decisão, prever riscos e sugerir cuidados preventivos. Enquanto isso, no direito, um agente investigador de crimes financeiros pode coletar e analisar evidências, formar narrativas e recomendar uma decisão ao profissional da área.

“Pessoas que trabalham em call centers podem resolver problemas em tempo real em vez de registrar solicitações e esperar dias por uma resposta. Se você é um líder financeiro, consegue identificar riscos e oportunidades antes que eles apareçam nos números. No RH, passa a ter insights instantâneos e automação que permitem que você se concentre na estratégia, na criatividade e no cuidado com o seu pessoal”, exemplifica Mike Sicilia, CEO da Oracle.

Durante o encontro, foram apresentados casos de uso reais que já estão sendo colocados em prática em diferentes áreas. Dawn Tintensor, vice-presidente de transformação digital da Wood PLC, empresa global de consultoria e engenharia que opera em 60 países, contou que, antes da adoção da tecnologia, trabalhava com dezenas de sistemas de RH para gerir seus 36 mil funcionários ao redor do globo. “Tínhamos muitas maneiras de trabalhar, com processos diferentes, e era muito difícil reunir os dados e relatórios de todos os nossos funcionários”, recorda.

Ao unificar os sistemas e adotar a IA, o trabalho passou a fluir, os profissionais ganharam mais autonomia e o tempo de contratação, que durava em média 45 dias, caiu para 21 dias. “Os agentes ajudam nossos funcionários e gerentes a encontrar as respostas que procuram e os orientam no fluxo de trabalho. As pessoas não precisam mais enviar um e-mail para o RH, entrar em contato com fornecedores e aguardar uma resposta. Elas entram no aplicativo, recebem a orientação sobre o que precisam e podem se concentrar novamente em atividades que agregam real valor ao seu trabalho”, relata.

Ravi Simhambhatla, chief digital and innovation officer do Avis Budget Group, de aluguel de veículos, faz uma analogia: “os dados são o novo petróleo, e a IA é o facilitador que faz esse petróleo ganhar vida”. Na sua visão, a tecnologia permite que os funcionários se tornem solucionadores de problemas em vez de coletores de informações.

Ele diz que a IA ajudou a tornar as compras mais eficientes na sua companhia. “Nossos técnicos precisam encomendar peças de carros. Não quero que eles tenham que pensar em qual peça pedir, para qual carro, e procurar o melhor preço. A IA faz isso por eles”, pontua. “Já para as empresas, ela devolve a mercadoria mais importante e que não temos controle: o tempo. Hoje, algo que levava cinco horas, é feito em dois minutos.”

“Os dados são o novo petróleo, e a IA é o facilitador que faz esse petróleo ganhar vida”

— Ravi Simhambhatla

No setor de serviços e hospitalidade, a IA é capaz de “trazer o humano para frente”, segundo Ty Breland, CHRO e vice-presidente executivo de serviços de operações globais da rede de hotelaria Marriott International. Por meio da IA e de um sistema unificado, a empresa está simplificando o processo manual de check-ins e reservas. “Os atendentes agora gastam menos tempo digitando e mais tempo conversando e cuidando das pessoas”, comenta. “Por muito tempo, quando falávamos sobre eficiência, a ideia era: ‘como fazer mais com menos?’. Agora, com a IA, podemos fazer menos, mas ter mais impacto.”

Para entender onde os investimentos deveriam ser direcionados, Breland revelou que decidiu ouvir os próprios funcionários. “Perguntamos para eles: ‘qual é a parte mais dolorosa do seu trabalho? Quais partes do processo estão te atrasando? Se pudéssemos modificar algumas coisas para simplificar e, ao mesmo tempo, enriquecer o seu papel, o que seria?’. Começamos por aí e, quando passamos a implantar as soluções, isso se tornou algo contagioso. Eles realmente queriam mais. Estão adotando, compartilhando com seus colegas e realmente colocando as ferramentas para funcionar”, conta.

Cerca de 4 bilhões de documentos são trocados mundialmente todos os dias em função do comércio exterior, revela André Barros, CEO da plataforma brasileira de logística internacional eComex. “Normalmente, seres humanos são responsáveis por recepcionar esses documentos e digitar as informações nos sistemas”, detalha. “Nós criamos um agente de IA que recebe os documentos, identifica, transforma as informações em dados estruturados e os processa automaticamente no sistema.”

Barros explica que, para poder confiar nos agentes de IA, é preciso monitorar e gerenciar as atividades deles. “Quem faz isso são as mesmas pessoas que foram liberadas daquele trabalho pesado e repetitivo de digitar faturas e documentos nos sistemas. Por isso, nós acreditamos que estamos passando muito mais por uma transformação humana do que por uma transformação digital”, elabora.

Calvin Butler, CEO da Exelon, empresa de fornecimento de energia que atende cerca de 10 milhões de clientes nos EUA, compartilha que o seu maior desafio foi conseguir convencer funcionários que trabalham na empresa há 30 ou 40 anos a utilizar a IA. “Eu posso ter toda essa tecnologia, mas se as pessoas não souberem como usá-la e não toparem, nada feito”, diz.

Ele recorda quando trabalhadores que faziam leituras de medidores de energia foram substituídas pela tecnologia e comenta que algo semelhante deve acontecer na era da IA. “Treinamos novamente todos esses profissionais e agora eles estão fazendo trabalhos dentro da organização que antes não tinham ideia de como fazer”, relata.

Já no setor público, a IA tem sido utilizada para trazer ganhos de velocidade na análise de processos da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo. Uma plataforma treinada com dados jurídicos gera resumos personalizados de petições e auxilia na elaboração de decisões judiciais. Também há um assistente que permite que os promotores usem linguagem natural para interagir com processos digitais, ajudando-os a recuperar documentos, localizar valores monetários ou pesquisar decisões passadas. “Existem muitos processos que ainda dependem somente de análise humana. A IA não vai substituir, mas pode facilitar, acelerar e diminuir o risco de erros”, avalia Bento Bueno, vice-presidente de setor público para a Oracle América Latina.

“Uma série de empresas está gastando grandes fortunas treinando modelos de IA. É o maior e mais rápido negócio da história da humanidade, maior até do que a Revolução Industrial”, declarou Larry Ellison, presidente do conselho e CTO da Oracle, ao abrir sua palestra no palco principal da conferência.

Ellison aproveitou a apresentação para compartilhar sua visão de futuro: “um mundo totalmente novo surgirá quando começarmos a usar esses notáveis cérebros eletrônicos para resolver os problemas mais difíceis e duradouros da humanidade”, assinalou.

Entre os usos práticos da IA citados pelo fundador da Oracle estão o diagnóstico precoce de câncer e a realização de cirurgias mais precisas. “A tecnologia nos ajudará a resolver problemas que não poderíamos resolver sozinhos. Isso nos tornará melhores cientistas, engenheiros, professores, chefs e médicos”, disse.

“Os robôs de IA são cirurgiões muito melhores do que os melhores médicos. Não porque eles são mais inteligentes do que nós, mas porque eles têm melhor coordenação entre olho e mão, e não precisam de um microscópio para ver onde termina o câncer e começa o tecido saudável”, apontou como exemplo.

Ele ainda destacou a capacidade de processamento de informações da tecnologia. “Os modelos de IA raciocinam muito rapidamente, podem lidar com muitos dados e obter respostas as quais nunca chegamos. Eles fazem deduções, inferem, calculam, têm estratégia e regras. Simulam e usam as mesmas técnicas de raciocínio que os humanos usam, mas pensam muito mais rápido do que nós ou resolvem problemas realmente complicados que não podemos resolver de forma alguma”, detalhou.

Seguindo as previsões de Ellison, Leandro Vieira, vice-presidente de IA e tech para a América Latina da Oracle, afirmou em entrevista ao Valor durante o evento que o design organizacional deve mudar completamente nos próximos anos. “Hoje, é como se cada organização fosse um quebra-cabeça. E cada área da empresa é uma peça desse quebra-cabeça”, explica. “Agora, vamos sair desse modelo de quebra-cabeça e imaginar que a IA são círculos. O ser humano vai ser a cola entre esses círculos, se tornando um interlocutor e conectando o que a IA faz ao que não faz. O recrutador, por exemplo, vai deixar a execução de lado para assumir uma visão mais analítica dos processos”, diz.

Apesar do clima de otimismo, especialistas divergem sobre quando exatamente poderemos ver esse futuro se concretizando. Vieira arrisca um palpite: “veremos uma grande mudança acontecendo nos próximos três a cinco anos”, aposta.

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