
Portos das regiões Norte e Nordeste do Brasil, conhecidos como Arco Norte, já escoam mais da metade dos grãos produzidos no Centro-Oeste. Para ampliar essa vazão, a liberação da construção da Ferrogrão é fundamental, argumentou Vanessa Gasch, diretora-executiva do Movimento Mato Grosso Competitivo (MMTC), durante debate da série “Logística no Brasil”, promovida pelo Valor, com oferecimento do Ministério dos Transportes e Infra S.A., no fim de setembro. A mediação foi da repórter especial Lu Aiko Otta, do jornal.
De acordo com Gash, o Mato Grosso avançou muito em termos de infraestrutura logística nos últimos anos, mas a diversificação modal por meio de investimento em ferrovias, rodovias e hidrovias é fundamental para distribuir a produção para grandes centros consumidores do Brasil e para outros países.
Com previsão de 933 km e custo inicial de R$ 11,45 bilhões, a Ferrogrão pretende ligar por trilhos Sinop (MT) até o terminal portuário de Miritituba, no Pará. Trata-se de um dos maiores planos de infraestrutura logística do país. O projeto, no entanto, está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) devido a uma ação do PSOL que questiona a modificação dos limites do Parque Nacional do Jamanxim, no Pará, para possibilitar o traçado da ferrovia.
“Em 2010, tínhamos cerca de 14% do escoamento de grãos para o Arco Norte. Hoje, são entre 50% e 53% dos grãos indo para lá. Há problemas de escoamento pelo rio Madeira, então precisamos viabilizar urgentemente a questão da Ferrogrão. Um estudo recente demonstrou que a saída [dos insumos] pelos portos do Arco Norte torna a exportação mais barata tanto para a China quanto para a Europa”, declarou Gasch.
A Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja) estima que as atuais 100 milhões de toneladas de produção de grãos passem para 140 milhões nos próximos dez anos. “Fora a produção industrial que está vindo a reboque nesse processo. O etanol, hoje, é um grande desafio logístico para se tirar do Estado de Mato Grosso”, afirmou Lucas Costa Beber, presidente da entidade, que também defende a Ferrogrão.
Cleiton Gauer, superintendente do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), lembrou que as BR-242 e BR-158 têm problemas de asfalto, prejudicando o transporte rodoviário.
“Ter uma ferrovia até Santa Cruz de La Sierra [Bolívia] resolve o problema”
— Paulo A. S. Lustosa
A Infra S.A., estatal sob o guarda-chuva do Ministério dos Transportes, afirma que a Ferrogrão é estratégica não apenas para o Centro-Oeste, mas para o Brasil. “Assim como são as rotas bioceânicas, que vão alterar a dinâmica geopolítica e econômica do país e do continente, oferecendo alternativas logísticas para exportação e integração territorial”, analisou Lilian Campos, superintendente de inteligência de mercado da autarquia.
Rotas bioceânicas preveem ligação rodoviária entre o porto de Santos (SP) e os chilenos de Antofagasta e Iquique, passando por Campo Grande, e um corredor ferroviário que conecte o porto de Chancay, no Peru, ao Acre, Rondônia e Mato Grosso, além das ferrovias de integração Centro-Oeste (Fico) e Oeste-Leste (Fiol) e até o porto de Ilhéus (BA). Segundo Campos, a Infra S.A. quer estabelecer um eixo multimodal de ferrovias, rodovias e portos para escoar a produção do Mato Grosso via Arco Norte, Chile ou Peru.
Paulo Afonso Rodrigues da Silva Lustosa, presidente da Federação Interestadual das Empresas de Transporte de Cargas (Fenatac), disse que a ligação até o Peru é inviável a partir de rodovias. “A saída para esse porto é ferrovia”, disse. Segundo ele, questões internas na Bolívia inviabilizam o trajeto rodoviário pelo país, caminho mais curto até Chancay a partir da região de Cuiabá. “Se alguém é atropelado, eles param a rodovia por cinco dias. Ter uma ferrovia até Santa Cruz de La Sierra [Bolívia] resolve o problema”, afirmou.
A solução, prosseguiu, é terminar a Fico e a Fiol e estender esse corredor para Rondônia, Acre, Peru e a parte baixa da Cordilheira dos Andes, área também difícil para transporte rodoviário de cargas.