
No que se refere ao mercado de biocombustíveis, a perspectiva para 2026 é a de que o segmento avance na mistura do biodiesel, chegando ao B16 (16% de participação na fórmula do óleo diesel) e ao E35 (35% de etanol na composição da gasolina). O apontamento é feito pelo presidente da Be8, Erasmo Carlos Battistella. Atualmente, os percentuais são, respectivamente, 15% e 30%.
Be8 é um dos principais agentes no País na área de biodiesel e se prepara também para atuar na produção de álcool (a companhia está construindo em Passo Fundo uma unidade de etanol a partir do processamento de cereais, que deve entrar em operação no final de 2026). Para Battistella, é fundamental que o setor e o governo trabalhem para abrir o mercado de exportação, pois o segmento cresceu. Outro ponto importante a ser focado, segundo o executivo, é a rentabilidade. Ele reforça que o setor precisa gerar resultado para continuar evoluindo de forma sustentável, tanto no aspecto econômico e social como no ambiental.
“Para o Rio Grande do Sul, o maior impacto do nosso trabalho será na cadeia produtiva através do fomento do triticale, do trigo e das culturas de inverno para a operação da fábrica de etanol e glúten vital (um concentrado proteico em pó obtido a partir da farinha de cereais)”, afirma o presidente da Be8. Battistella adianta que serão fundamentais as parcerias que a empresa está realizando com produtores, cerealistas e cooperativas para aumentar o fornecimento de matéria-prima.
O dirigente ressalta que para a empresa 2026 será um ano de consolidação dos projetos que estão em andamento – em especial, o empreendimento de etanol e uma iniciativa envolvendo o hidrogênio verde, para a qual a companhia tem 24 meses para implementá-la. Esse projeto-piloto, também sendo desenvolvido em Passo Fundo, prevê a instalação de um posto de abastecimento de caminhões extrapesados com motores adaptados, utilizando o hidrogênio verde produzido a partir de etanol. Com investimento estimado em R$ 38,7 milhões, a iniciativa busca avaliar a viabilidade técnica, operacional e econômica do uso do hidrogênio no transporte rodoviário pesado.
Por sua vez, o presidente do Conselho de Administração da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), Francisco Turra, elogia a sanção da Lei do Combustível do Futuro (Lei 14.993/2024). “Passamos a ter um marco regulatório que amplia o modelo de previsibilidade e segurança jurídica para investimentos de longo prazo no setor de biocombustível”, comemora o dirigente.
Ele ressalta que a lei abre espaço para diversos avanços concretos como, por exemplo, o aumento progressivo da mistura de biodiesel no diesel fóssil, caminhando para 20% em 2030, com possibilidade de chegar a 25% no futuro. Ao mesmo tempo, cria rotas e incentivos não apenas para o etanol e biodiesel, mas também para outros biocombustíveis — como biometano e diesel-verde — e para o combustível sustentável de aviação (SAF).
“Nesse contexto, estamos diante de um período de intensa expansão e reestruturação”, diz Turra. O dirigente comenta que o setor verifica atualmente investimentos em aquisição de empresas, modernização e ampliação de esmagadoras de soja, construção de novas usinas e expansão da capacidade instalada em plantas de biodiesel. Esses investimentos visam atender à demanda crescente de matéria-prima e combustível no cenário pós-lei.
“Importante também destacar o papel social e territorial dessa expansão: o regime legal favorece o uso de matérias-primas renováveis, incluindo aquelas oriundas da agricultura familiar. Isso contribui para a geração de renda no campo, diversificação da produção agroenergética e fortalecimento das cadeias produtivas locais, o que é especialmente relevante para estados como o Rio Grande do Sul”, aponta o presidente da Aprobio.
A secretária estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura, Marjorie Kauffmann, complementa que o Rio Grande do Sul tem crescido bastante no campo de biocombustíveis. “A gente amadureceu nessa área”, frisa a dirigente. Ela recorda que em novembro esteve no município de Santiago, visitando o projeto da CB Energia, que irá produzir etanol a partir de trigo e de outros cereais.
Além da capacidade para fabricar 40 mil litros ao dia de etanol, que poderá ser o hidratado (usado como combustível veicular) ou o neutro (utilizado em cosméticos e bebidas), a unidade poderá produzir 25 toneladas de CO₂ ao dia (gás empregado pela indústria de refrigerantes e água mineral), álcool hospitalar e 30 toneladas diárias do concentrado proteico DDGS. “A importância da agricultura para a área energética só tende a aumentar nos próximos anos”, conclui a secretária.
Candiota 3 ganha sobrevida, mas continua alvo de críticas de ambientalistas
A termelétrica a carvão Candiota 3, que estava operando de forma intermitente no mercado de curto prazo durante todo 2025, sem garantias de maior continuidade, teve no final deste ano a sua geração assegurada até 2040 pela Emenda 37, do senador catarinense Esperidião Amin (PP), à Medida Provisória (MP) 1304/25. Apesar desse novo fôlego, a usina continua provocando manifestações contrárias à sua manutenção por ambientalistas.
O gerente de Transição Energética do Instituto Internacional Arayara, John Fernando de Farias Wurdig, considera que, apesar de legalmente ter sido permitido o funcionamento de Candiota 3 por mais 15 anos, a operação da usina é insustentável. “Há problemas relativos a violações das emissões atmosféricas e do não atendimento à legislação ambiental”, acusa Wurdig.
Ele salienta que, em pleno ano da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30) no Brasil, foi possibilitada pelo Congresso Nacional e pelo governo federal (que não vetou a questão) a continuidade da termelétrica a carvão. O integrante do Instituto Internacional Arayara pondera que foi usado o discurso de preservar os trabalhadores para que fosse garantida a continuidade da usina no município de Candiota, contudo, de acordo com ele, foi um argumento inválido.
Wurdig lembra que há ações civis públicas que questionam Candiota 3, pedindo a suspensão da licença de operação da térmica devido aos passivos ambientais do complexo. Ele lembra que a licença da usina vence em abril de 2026 e, caso não seja renovada pelos problemas ambientais, a termelétrica irá fechar. “E a usina fechando, não está garantida a transição energética justa e sustentável, o emprego desses trabalhadores, a aposentadoria compulsória e a requalificação deles em outros empregos e nem a recuperação ambiental dos passivos e o abatimento das emissões de gases de efeito estufa já gerados”, enfatiza o representante do Instituto Internacional Arayara.
Já o presidente da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS), Fernando Zancan, manifesta otimismo quanto ao futuro da usina gaúcha. “Candiota 3 passou do estado da insegurança para o da segurança”, afirma o dirigente. Ele argumenta que a possibilidade de ter um contrato de longo prazo permite à usina planejar investimentos, observar novas tecnologias e fazer estudos.
“Eu tenho certeza que a Âmbar (empresa responsável pelo empreendimento) está trabalhando tudo isso inclusive sob o enfoque da redução da pegada de carbono”, diz Zancan. O presidente da ABCS lembra que recentemente uma delegação de representantes da Âmbar, assim como dos governos gaúcho e federal, esteve na China para acompanhar tecnologias de captura de CO₂.
A termelétrica gaúcha tem uma potência instalada de 350 MW, suficiente para atender a aproximadamente 1 milhão de pessoas. O consumo médio de carvão do complexo, em condições normais de operação, é de cerca de 1,5 milhão de toneladas ao ano. Procurada pela reportagem do Jornal do Comércio, a Âmbar preferiu não se pronunciar no momento sobre os planos para Candiota 3.