
Mesmo a 18 mil km de distância, o conflito entre Rússia e Ucrânia paralisou parte das obras da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) na Bahia (Fiol). Em abril, a Bahia Mineração (Bamin), responsável pela construção, suspendeu a obra do trecho 1 da via, entre Caetité e Ilhéus. Isso porque a empresa, controlada pelo Eurasian Resources Group (ERG), é do Cazaquistão, que sentiu fortemente os impactos econômicos da guerra.
“A Bamin, infelizmente, teve um problema sério com a guerra e ficou sem recursos para implementar [a Fiol 1]. O governo está tratando esse assunto como prioridade, e eu acho que isso vai se resolver”, disse Jorge Bastos, presidente da Infra S.A., em evento do Valor no final de outubro.
Procurada, a Bamin não se manifestou. Também no fim de outubro, porém, o presidente da empresa, Eduardo Ledsham, abordou o tema durante a abertura da Exposibram, congresso de mineração que ocorreu em Salvador. Ele confirmou que a empresa sofreu impactos econômicos decorrentes do conflito ucraniano e que, desde então, vinha procurando soluções para capitalizar R$ 5,7 bilhões em investimentos.
“Estamos trabalhando com três propostas reais [de potenciais investidores], todas interessadas em um projeto integrado – mina, ferrovia e porto”, afirmou Ledsham na ocasião, acrescentando que cerca de R$ 4,8 bilhões já estão assegurados via linhas de crédito do governo federal. O restante deve vir do novo sócio na empreitada.
Mas a espinha dorsal da estratégia é a conclusão da Fiol 1, que, embora paralisada, tem 62% das obras concluídas, segundo o CEO da Bamin. O novo parceiro da empresa deve ser definido até o começo do ano que vem, mas essa reconfiguração deve passar pela repactuação do contrato de concessão, mediante solicitação da extensão do cronograma de 2027 para 2031. “É um processo natural. Um projeto dessa dimensão exige ajuste de prazos e de responsabilidades, sempre em diálogo com o Ministério dos Transportes e a ANTT [Agência Nacional de Transportes Terrestres]”, apontou o executivo.
Tanto pela empresa quanto pelo governo, a integração entre logística das ferrovias, agronegócio e mineração é apontada como uma estratégia de desenvolvimento e de transformação do Nordeste, além da interligação com outros corredores logísticos. Junto à Fiol, o Porto Sul, em Ilhéus, que ainda não saiu do papel, é tido como um corredor que deve reduzir o custo de frete em até 40%, calculou Ledsham.
Bamin estuda três propostas para um projeto que integre mina, ferrovia e porto, disse o CEO, Eduardo Ledsham, durante evento
A Bamin detém a mina Pedra de Ferro, em Caetité, com capacidade de produção de até 2 milhões de toneladas por ano do minério com alto teor (65% de concentração do elemento), o que atrai interesse de eventuais exportadores. O escoamento do ferro, no entanto, depende da conclusão da ferrovia.
De acordo com o presidente da Infra S.A., a conclusão da Fiol é estratégica por integrar a produção mineral e agrícola ao sistema portuário. “A Fiol 2 [Guanambi- Caetité], hoje, já está a pleno vapor. Destravamos grande parte dos gargalos e estamos botando em licitação quase todos os trechos para terminar no prazo mais rápido possível”, disse Bastos.
Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), porém, apontou “atraso significativo” nas obras. “Após nove meses de execução (dos 26 meses de vigência contratual prevista), apenas 3% do contrato foi medido, sem que nenhum projeto executivo tenha sido aprovado ou que tenha ocorrido o início das etapas de construção. Isso representa atrasos de nove meses para projetos e quatro meses para obras”, apontou o órgão em outubro.
O tribunal avisou a Infra S.A. que a falta de abertura de processos para punir empresas contratadas, que não estão cumprindo prazos ou regras do contrato, pode ser vista como falha da autarquia, mas recomendou que cada caso seja avaliado com cuidado. Metade dos 485 km que compõem a Fiol 2 já possuem trilhos.
Já os 840 km da Fiol 3, que ligam Mara Rosa (GO) a Correntina (BA), ainda estão em planejamento. Todos os trechos da ferrovia se integram ao Corredor Ferroviário Leste-Oeste, projeto tido como estratégico pelo Ministério dos Transportes. A ideia é conectar a Fiol à Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico), fazendo integração logística para o escoamento da produção de grãos e etanol entre esta região e o Nordeste para o mercado internacional. O edital para a concessão do corredor deve ser lançado no primeiro semestre de 2026, segundo a pasta.