O “jabuti” com prazos para setor da mineração saiu do relatório final da Medida Provisória com as regras da Licença Ambiental Especial (LAE). Como mostrou O GLOBO, além de polêmica, a medida, que aumentava de seis meses para seis anos o tempo máximo para que se inicie uma mineração após a autorização ser publicada, não tinha relação direta com o tema do texto. O relatório foi aprovado em Comissão Mista na manhã desta terça e agora vai a plenário.
O deputado Zé Vitor (PL-MG), relator da matéria, explicou que o prazo seria uma forma de combater a chamada “especulação de títulos minerários”, quando uma pessoa ou empresa, após conseguir a autorização oficial para mineração em determinada área, aguarda intencionalmente a subida de preços do minério para então revender ou repassar seu título.
Entretanto, especialistas destacaram que as regras atuais já colocam um prazo, menor, de até um ano, para que se inicie a atividade minerária. Portanto, o novo limite de seis anos poderia beneficiar parte do setor.
O trecho, no final das contas, saiu do relatório final que foi aprovado nesta terça (2) pela Comissão Mista Especial do Congresso. Agora, o texto será votado no Plenário. Segundo Zé Vitor, o prazo para mineração será discutido “em outro momento”.
Além do “jabuti” da mineração, a principal alteração entre o parecer e o relatório final foi a retirada da previsão de licença simplificada para abastecimento de água e esgotamento sanitário. O relatório aprovou os termos da Licença Ambiental Especial (LAE) para agilizar o licenciamento de atividades ou empreendimentos definidos como “estratégicos” em decreto do Conselho de Governo. Assim, a licença terá prazo de um ano para ser analisada, em três etapas.
O deputado Zé Vitor explicou que o relatório colocou tipos de empreendimentos elegíveis à LAE. O texto diz que “obras de reconstrução e repavimentação de rodovias preexistentes cujos trechos representem conexões estratégicas, relevantes na perspectiva da segurança nacional, do acesso a direitos sociais fundamentais e da integração entre unidades federativas” são consideradas estratégicas.
Além de tratar da Medida Provisória 1.308, o relatório incluiu outros pontos referentes ao Novo Licenciamento Ambiental. Uma complementação, explicou o deputado Zé Vitor, foi vetar a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) para projetos de mineração, com exceção de extração de “areia, cascalho, brita e lavra de diamante por faiscação sem desmonte de talude”.
Deputado rechaça ‘desmonte ambiental’
A LAC, uma espécie de licença simplificada autodeclaratória, vem sendo alvo de ambientalistas, que criticam essa flexibilização. Na nova lei de licenciamento, a LAC poderá ser usada em empreendimentos de médio porte, o que afeta a maioria dos projetos do setor industrial, como mostrou O GLOBO.
— Não é só declarar e ir embora. O empreendedor assume uma série de compromissos, respeitando as características do uso do território, tem muita regra — defendeu Zé Vitor, que rechaçou a acusação de que a nova lei desmontaria a política ambiental nacional. — Não é desmonte porque o rigor inclusive agora é maior. Pela primeira vez estamos trazendo obrigatoriedade de analise de risco ambiental.
ONGs criticam
Já institutos e ONGs ambientalistas prometem entrar na justiça contra pontos da nova lei. O governo federal também estuda acionar o STF.
— Com a nova lei, licenciar empreendimentos torna-se exceção no país e não regra — diz Suely Araújo, coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima. — O Congresso Nacional comete um atentado histórico contra a saúde e a segurança dos brasileiros, contra o clima e contra o nosso patrimônio natural.
Em maio, quando o projeto chegou ao Senado, foram identificadas seis inconstitucionalidades no texto pela liderança do governo: a União delegar a definição de atividades que devem ser licenciadas a estados e municípios; a transformação de Funai, Iphan, ICMBio, Fundação Palmares e Ministério da Saúde em órgãos apenas consultivos; o aumento de possibilidades de dispensa de licenciamento; a dispensa de licenciamento para atividades ou empreendimentos agrossilvipastoris (que integram atividades agrícolas, florestais e pecuárias); a LAC, que, conforme decisão do STF, só é constitucional para empreendimentos de pequeno impacto e baixo risco; e a renovação automática de licenças ambientais vencidas sem nova consulta aos órgãos ambientais competentes.
O Greenpeace Brasil divulgou nota criticando o que consideraou uma aprovação “a toque de caixa”. O instituto lembrou que o relatório final só foi apresentado na véspera da votação, impactando debates.
— A MP 1.308/25 foi feita para políticos e empresários lucrarem com grandes obras e sem que os estudos técnicos de impacto ambiental e o interesse público tenham sido resguardados. Prova disso, é a forma como o relatório foi aprovado na Comissão Mista: sem reuniões do colegiado, sem debate público, sem ouvir os parlamentares e sem tempo hábil para se garantir a qualidade da lei e o cumprimento das metas nacionais de emissão — afirma a especialista em Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, Gabriela Nepomuceno.
O Instituto Arayara disse que “o Congresso enterrou de vez as medidas ambientais que protegem os biomas brasileiros”, e que a LAE institucionaliza a “interferência política sobre a análise técnica”. Segundo análise do instituto, a LAE romperia com “o modelo preventivo do licenciamento ambiental brasileiro”, que garante a avaliação de impactos antes das obras.