Líquido da castanha-de-caju pode ser ativo sustentável na siderurgia

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Leandro Miranda Nascimento é graduado em Engenharia Metalúrgica pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre em Engenharia de Materiais pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e doutor em Engenharia e Ciência de Materiais pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Recebeu bolsa da CAPES/MEC no doutorado, etapa em que desenvolveu projeto para aplicação do líquido da castanha-de-caju como aglomerante mineral na siderurgia. A prática viabiliza um processo siderúrgico mais limpo, com menor emissão de dióxido de carbono.

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O trabalho com o LCC, líquido da casca da castanha-de-caju, surgiu como uma solução para a fabricação de ligantes aplicáveis na aglomeração de minério de ferro. O professor Diego Lomonaco já trabalhava com o LCC há bastante tempo e possuía desenvolvimentos sem aplicação prática definida. Por outro lado, eu buscava uma alternativa de ligante de base biossustentável que pudesse substituir produtos inorgânicos e mais poluentes. A combinação foi bastante feliz.

Cheguei a procurar instituições como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), sem sucesso, até encontrar na pesquisa do professor Diego o potencial desejado. Houve sinergia entre uma demanda industrial concreta e uma pesquisa química avançada. Encontramos um ponto em comum: o desejo de transformar ciência em soluções reais para a indústria.

Qual a importância dessa parceria para a sociedade e o setor produtivo?

A aglomeração pode ser realizada por processos a quente — como sinterização e pelotização — ou a frio, como a briquetagem. Os processos a frio, com o uso de ligantes adequados, emitem significativamente menos dióxido de carbono, sendo ambientalmente mais sustentáveis. Portanto, há um ganho direto para a sociedade ao se reduzir a pegada de carbono da cadeia siderúrgica.

Além disso, o LCC é um coproduto da agroindústria, o que viabiliza o aproveitamento de resíduos da cadeia do caju. Ao mesmo tempo, seu uso permite agregar valor a outros resíduos da indústria siderúrgica, não só minério, como diversos resíduos industriais siderúrgicos ricos em ferro. É um caso claro de economia circular, em que resíduos se tornam insumos de alto valor.

Do ponto de vista técnico, os ligantes à base de LCC têm baixa concentração de elementos indesejáveis como sódio, potássio, zinco, enxofre e fósforo, tornando-os superiores a outras alternativas. Também possibilitam a produção de briquetes com maior resistência à umidade, essencial para transporte e armazenamento com segurança e eficiência.

Qual a importância da aproximação entre universidade e empresa?

O investimento em pesquisa no Brasil está concentrado, em grande parte, na esfera pública, por meio de universidades e agências de fomento como a CAPES/MEC. Embora as pesquisas gerem valor econômico, social e científico, o setor privado geralmente só investe quando enxerga retornos concretos.

Nesse sentido, a aproximação entre universidade e empresa permite alinhar o conhecimento acadêmico às demandas reais do mercado, aumentando a chance de gerar inovação com aplicação direta. A empresa tem expertise para avaliar o retorno técnico-econômico de uma solução; já a universidade tem capacidade para explorar caminhos novos e disruptivos.

Qual a importância da bolsa CAPES/MEC?

A bolsa CAPES/MEC foi essencial para viabilizar meu doutorado. No início do processo seletivo, não fiquei entre os primeiros colocados, mas consegui melhorar minha posição na entrevista e garantir a bolsa já no primeiro mês — algo que foi crucial, pois estava longe do meu estado de origem.

Entretanto, mesmo com a bolsa, os valores não cobriam todos os custos. Quando entrei, em 2018, os valores estavam congelados desde 2013. Além disso, as regras da CAPES/MEC dificultavam a conciliação entre atividades remuneradas e o recebimento da bolsa. Precisei recorrer a trabalhos informais, com muito cuidado para não infringir as regras.

A flexibilização recente dessas normas, aliada aos reajustes promovidos em 2023, representam avanços importantes. Para a maioria dos pesquisadores, a bolsa não é apenas um incentivo, mas a base para que a pesquisa aconteça. É um investimento direto no desenvolvimento do país.

O que planeja para o futuro?

Depois do meu doutorado, várias empresas se mostram interessadas na pesquisa. Atualmente, temos dois projetos estudando ligantes na aglomeração. E estamos conversando com outras empresas sobre possibilidade de outros projetos ou escalonamento da solução para uso industrial.

Paralelamente, eu dou aula em universidade privada e atuo como consultor-pesquisador em siderurgia. O que me permite seguir próximo da indústria sem perder o vínculo com a pesquisa acadêmica.

Embora a carreira por concurso público seja uma possibilidade interessante, sobretudo pela estabilidade, o cenário atual tem se mostrado bastante promissor para consolidar parcerias produtivas entre universidade e setor industrial. Estou focado em aproveitar esse momento para transformar conhecimento em inovação concreta.

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