O que vale mais para você: confiança ou competência?

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Uma das cenas mais emblemáticas que eu gosto de lembrar do cinema é quando a personagem vivida por Adrienne Shelly pergunta para o rapaz que acaba de a pedir em casamento o que significa amor para ele. Ele diz que amor não existe, mas sim respeito e admiração. Ela diz que só aceita ficar com ele se ele admitir que respeito + admiração + confiança = amor. Então, ela se joga para trás de um muro, e o rapaz, personagem de Martin Donovan, a recebe nos braços no susto, impedindo que ela se espatife no chão. Ela dá um sorriso maroto e o abraça: ele passou no teste de confiança. O filme é “Confiança”, do cineasta indie Hal Hartley.

A esta altura você pode estar se perguntando o que isso tem a ver com carreira e gestão. Para mim, tem tudo a ver. Um ingrediente fundamental no trabalho, em qualquer posição, é a confiança, algo intangível e sem preço. O líder que se joga em um projeto porque acreditou em uma ideia que surgiu de uma equipe que ele admira e respeita e por isso inspirou confiança para ele se arriscar. Um funcionário que por admirar, respeitar e confiar em um líder é capaz de fechar os olhos e se jogar em projetos, jornadas e em todo tipo de desafio com respeito e admiração.

Esses três ingredientes citados no filme, combinados, têm um poder gigante de engajar, fazer prosperar e crescer uma empresa, um negócio ou um objetivo comum. A falta de um desses elementos, por sua vez, pode minar a performance, as boas ideias e o desenvolvimento individual ou de um time. E nessa tríade, confiança é um dos elementos-chave e de difícil regeneração. Uma quebra de confiança com uma mentira, uma traição, não tem remendo que conserte.

Um estudo dos pesquisadores Xuchang Zheng, Wanxin Wang e Jonathan Pinto, chamado “When Does Competence Matter?”, mostra que às vezes deixamos de lado o bom desempenho ou a pessoa mais competente e depositamos confiança em indivíduos que podem não ser perfeitos em seu trabalho. A pesquisa revela que a competência, sozinha, pode ter pouco peso na construção de uma relação de confiança duradoura e resiliente.

O professor Xuchang Zheng, de comportamento organizacional na Dublin City University, um dos responsáveis pelo estudo, diz que ele revela que a habilidade importa, mas apenas quando acompanhada de fortes traços de caráter, como justiça e bondade. Um dos principais achados da pesquisa, segundo ele, sugere que não confiamos automaticamente em pessoas altamente competentes. O caráter funciona como uma porta de entrada.

Quando percebemos alguém como justo, honesto e atencioso, suas habilidades realmente contam para nós. Mas se acreditamos que alguém tem um caráter duvidoso, sua competência não conquista nossa confiança. Na verdade, pode até nos deixar mais desconfiados, segundo Zheng, pois tememos que a pessoa use suas habilidades de uma forma prejudicial. Ou seja, confiança não é apenas ser bom em algo; é sobre como você usa as suas habilidades.

A percepção de que a pessoa é alguém confiável sempre abre portas nas organizações e na formação de times. Outro estudo, conduzido por Cynthia Maupin, professora-assistente de liderança e comportamento organizacional em Binghamton, escola que pertence à Universidade Estadual de Nova York, reforça essa tese. Ele mostra que partimos do pressuposto de que as pessoas são selecionadas para forças-tarefa e equipes importantes por causa do seu conhecimento, habilidades e competências, no entanto, a pesquisa sugere que, muitas vezes, elas são escolhidas porque os colegas de equipe se sentem à vontade com elas.

O estudo mostra ainda que pessoas amigáveis e confiáveis têm mais chances de serem selecionadas para equipes do que aquelas conhecidas apenas por sua competência técnica e reputação pessoal.

Ninguém quer um profissional incompetente na equipe porque isso seria dar um tiro no pé, mas ter alguém em quem não se confia pode ser igualmente nocivo. Sabemos que as competências técnicas podem ser ensinadas e desenvolvidas ao longo do tempo, já características associadas à personalidade são difíceis de serem transformadas e esta não é uma atribuição para os gestores de empresas. Então, se alguém reúne competência e bom caráter em sua equipe, cuide bem, pode ser uma jabuticaba!

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