
Na lógica da busca por soluções que agreguem valor ao que é produzido neste recorte do Rio Grande do Sul, nada melhor do que o campus universitário. É neste local, em uma área arrendada de 2 hectares, no chamado Tecnoagro, da UPF, em Passo Fundo, que a Begreen Bioenergia pretende erguer uma das suas plantas de produção de amônia anidra a partir de hidrogênio verde para o fornecimento à fabricação de fertilizantes. Em fase de licenciamentos, o plano da empresa é iniciar as obras no primeiro semestre de 2026 e, no segundo semestre de 2027, iniciar a produção a partir do hidrogênio verde obtido a partir da água.
A Begreen é uma das empresas aprovadas no edital aberto pelo Governo do Estado para o desenvolvimento de projetos de hidrogênio verde. De acordo com o diretor de novos negócios da empresa, Fábio Saldanha, até o momento foram desembolsados R$ 1,5 milhão no projeto, que prevê pelo menos R$ 110 milhões em aportes, incluindo outra planta em Tio Hugo, no Alto da Serra do Botucaraí.
“Teremos bolsistas de mestrandos e doutorandos da universidade participando do projeto, e também temos o compromisso de promover cursos na UPF para a qualificação de mão de obra para a atuação nesse tipo de empreendimento, que é uma tendência para os próximos anos no Estado”, diz Saldanha.
A partir do processo de hidrólise, a planta dentro do campus da UPF terá capacidade para produzir 2 mil toneladas de amônia anidra por ano. A partir de processos industriais, essa amônia gera a ureia. São elementos fundamentais para fertilizantes nitrogenados.
“Teremos uma capacidade produtiva bem pequena se comparada, por exemplo, ao que já se faz no Nordeste. Nossa capacidade em Passo Fundo vai representar 1% do que se faz lá. Mas a nossa ideia, com plantas em Passo Fundo e Tio Hugo, e possivelmente outras, é descentralizar a produção em várias unidades, sempre próximas dos centros de consumo”, explica.
Segundo Fábio Saldanha, já acontece a aproximação com fabricantes de fertilizantes no Rio Grande do Sul. O Estado hoje importa 100% dos fertilizantes nitrogenados.
“É uma oportunidade que está aberta. A compra desse material hoje é feita a partir de mercados bastante instáveis, em guerras, como o Leste Europeu. E lá, a produção não é limpa, como teremos aqui, a partir do hidrogênio verde. Hoje o mercado da amônia para os fertilizantes líquidos ainda precisa ser construído, mas o Brasil precisa entrar neste circuito com o diferencial da baixa emissão de carbono”, aponta o diretor da Begreen.
Em março deste ano, iniciaram as obras na universidade de um novo distrito de inovação, o Passo Fundo Valley, com investimento de R$ 13 milhões e previsão de entrega em maio de 2026. Serão novos espaços dentro do UPF Parque, destinados a empresas, startups e à integração entre o que é desenvolvido no campus e a comunidade.
Ao todo, o Passo Fundo Valley terá 2,9 mil metros quadrados de área construída dedicados a negócios inovadores, com direito a arena e espaço para experimentação. De acordo com a UPF, que leva adiante a ideia em parceria com a Prefeitura de Passo Fundo, o projeto tem potencial de beneficiar 144 municípios do norte do Rio Grande do Sul.
A proposta inicial do Passo Fundo Valley será apoiar a geração e o desenvolvimento de 30 novas startups ao longo dos primeiros anos de operação. Além disso, é prevista a criação de mais de 40 novos postos de trabalho diretos no setor de tecnologia e inovação e a atração de dez novas empresas residentes para fortalecer o ecossistema de inovação local.
Biocombustíveis alternativos são projetados em laboratório
É o fomento necessário para fazer decolar pesquisas inovadoras como as lideradas pela engenheira ambiental e professora Luciane Colla na UPF para o desenvolvimento de bioetanol a partir de matérias-primas alternativas. Em 2012, a partir de microalgas, e, em 2021, a partir de resíduos alimentares, por exemplo, de restaurantes, refeitórios industriais e mercados.
“A pesquisa com alimentos encerrou este ano, com alto rendimento entre algumas matérias-primas em escala laboratorial, mas ainda sem escala pré-industrial ou industrial. O que temos é um mercado muito interessado neste setor e nós, na academia, temos que estar um passo à frente. Por exemplo, antes de virar uma alternativa industrialmente possível, já sabemos que a microalga é viável, ou que produtos industrializados, como batatas congeladas semi-fritas, descartadas na distribuição, podem ter um uso na geração de bioetanol com muito maior valor agregado do que a destinação para rações, ou ainda com pães e massas, com grande quantidade de carboidratos”, diz a pesquisadora.
Como parte da pesquisa, o grupo acompanhou por uma semana a geração de resíduos em supermercados de Passo Fundo. Eram toneladas diretamente enviadas aos aterros, como lixo não reaproveitável.
“Nos chamou a atenção a possibilidade de geração de bioetanol a partir de frutas, como a banana, mamão e casca de maçã. Os resíduos alimentares, de maneira geral, são um problema relacionado ao desperdício, que se torna um fator de insegurança alimentar e não pode ser perdido como possibilidade de matéria-prima para a obtenção de bioprodutos e biocombustível”, conta Luciana.
Ao invés do lixo como destino, ou a outros usos com menor valor agregado, frutas, legumes e produtos alimentícios industrializados que seriam descartados tornaram-se blends de matéria-prima para a “usina” criada em laboratório. É nessa etapa que, segundo a pesquisadora, se apresenta o grande desafio para que seja viável uma escala industrial a este projeto.
“Normalmente as plantas de bioetanol usam uma matéria-prima única. Isso porque a hidrólise (que é o processo químico de desestruturação daqueles alimentos) é feita a partir de enzimas específicas para cada matéria. Para garantir maior celeridade nos processos, as usinas importam a enzima já produzida, há uma dependência desse insumo. Em laboratório, conseguimos produzir cepas e isolar algumas enzimas capazes de processar amido ou até celulose, no entanto, o desafio que fica lançado é desenvolver processos para que essa produção de enzimas se torne eficiente no nível industrial”, comenta a engenheira.
A pesquisa resultou em pelo menos 16 trabalhos científicos produzidos pelos participantes do projeto. E Luciane Colla segue pesquisando outras fontes alternativas para a geração de biocombustíveis. O alvo da vez é o nabo forrageiro.
Produção de fertilizantes
– Agrodanieli (Tapejara)
– BeGreen (Passo Fundo, Tio Hugo)
Centros Tecnológicos/Universidades
– Santa Rosa (Tecnopuc, Unijuí)
– Cruz Alta (CCGL Tech, Unicruz)
– Ijuí (Unijuí)
– Augusto Pestana (Unijuí)
– Passo Fundo (UPF, Atitus, Embrapa Trigo)
– Erechim (URI)
– Santo Ângelo (URI)
– Panambi (Instituto Integrar)