
Na liderança do Mercosul até dezembro, o Brasil tem uma agenda de pelo menos seis acordos em andamento — entre negociações praticamente fechadas, processos em estágio avançado e a abertura de novos diálogos. Isso explica as viagens atuais e planejadas de negociadores brasileiros para a Ásia e segundo o Carlos Frederico Coelho, professor da PUC-Rio, alinha-se aos objetivos declarados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). A guerra comercial imposta pelo governo de Donald Trump ao restante do mundo certamente acelerou o ritmo dessas negociações. Diversificar a pauta comercial brasileira, ainda excessivamente concentrada na China e, em menor escala, nos Estados Unidos e na Europa, tornou-se uma necessidade estratégica. E essa necessidade não é só brasileira, pontua Lia Valls, pesquisadora do FGV Ibre e professora da Uerj.
— Quando o maior importador mundial, a maior economia do mundo, passa a colocar uma série de tarifas e barreiras para entrada no seu mercado, os países têm que procurar diminuir sua dependência dos Estados Unidos até onde eles possam. Com isso, obviamente, acelera a vontade, a procura por mais acordos — ressalta a professora.
O fato é que Trump acabou dando impulso a uma série de acordos que vinham sendo discutidos há anos. Um exemplo é o Acordo Mercosul-União Europeia, debatido há cerca de duas décadas, que agora se encontra na fase final de ajustes e caminha, enfim, para a assinatura.
Segundo Carlos Frederico a previsão do governo é enviar ainda neste ano ao Congresso o acordo entre o Mercosul e Singapura. O país é o sexto maior destino das exportações brasileiras e o Porto de Singapura é uma ponte estratégica para outros mercados asiáticos.
Depois de Singapura, o foco será a negociação entre Brasil e México, e entre Mercosul e Índia. Em ambos os casos, tratam-se de acordos de complementação econômica, e não de livre comércio.
José Niemeyer, professor de Relações Internacionais do Ibmec-RJ, diz que Trump está indo contra essa lógica da globalização comercial e está tentando criar uma autarquia nos Estados Unidos, produzindo tudo que precisa de bens e serviços. Na sua visão, a China tem atuado de forma mais estratégica.
– Há uma questão geopolítica e geoestratégica também, que ao redor da China tem uma quantidade maior de países em crescimento econômico no Sudeste Asiático, A China está se aproveitando disso, criando um sistema de compra e venda de produtos ao seu redor. Por isso que os Estados Unidos têm tanto interesse na manutenção dos parceiros estratégicos próximos à China. O gigante asiático ganhou muito poder político, diplomático e até estratégico militar e cada vez mais reafirmar esse seu espaço subregional e regional. Com o tarifaço, observamos que o Brasil, via Mercosul, o vem buscando novas opções, principalmente nos países que orbitam em torno da China.
O ministério também projeta concluir as negociações com os Emirados Árabes Unidos, retomar as tratativas com o Canadá e avançar nas conversas com Indonésia e Vietnã. Estes dois últimos países preocupam o setor industrial brasileiro, que teme a forte competitividade das indústrias asiáticas. Uma comitiva brasileira está atualmente na Índia para iniciar oficialmente as discussões. Além disso, a meta é lançar a tratativa de um acordo com o Japão.
— O tarifaço deixou ainda mais clara — e urgente — a necessidade de buscar alternativas. No entanto, diversificar o comércio exterior é mais fácil de dizer do que de fazer. A construção ou reconstrução de redes logísticas e de cadeias de valor toma algum tempo e não é imediata — explica o professor da PUC-Rio.