
Levitação embolada
A tecnologia da levitação acústica e das pinças sônicas vem-se desenvolvendo rapidamente devido ao amplo leque de aplicações, já que ela torna possível mover pequenos objetos com precisão e sem contato.
Mas, até agora, a levitação por som tem funcionado bem quando se trata de manipular uma única partícula. Quanto se tenta levitar múltiplas partículas, elas se atraem como se fossem ímãs. Esse “colapso acústico” ocorre porque as ondas de som que refletem nas partículas criam forças de atração entre elas.
Agora Sue Shi e colegas do Instituto de Ciência e Tecnologia da Áustria venceram essa limitação fundamental da técnica.
“Originalmente, estávamos tentando encontrar uma maneira de separar partículas levitadas para que elas formassem cristais – padrões repetitivos específicos,” contou Shi. Foi então que ela percebeu que resolver o problema do colapso acústico, separando as partículas, era ainda mais promissor.
Forças elétrica e eletrostática
A chave para resolver a deficiência da levitação com som consistiu em adicionar outra força para neutralizar o colapso acústico. Para isso Shi, lançou mão da carga elétrica das partículas e da repulsão eletrostática entre elas. “Ao neutralizar o som com a repulsão eletrostática, conseguimos manter as partículas separadas umas das outras,” resume a pesquisadora.
Depois de desenvolver uma técnica para carregar eletricamente as partículas, a equipe descobriu que é possível ajustar a carga elétrica de cada uma para levitar as partículas em diversas configurações.
Os experimentos feitos até agora obtiveram sistemas de partículas completamente separadas, totalmente colapsadas e híbridos intermediários, com componentes separados e colapsados. A equipe também conseguiu fazer as partículas ricochetearem na placa refletora inferior do sistema de levitação, que fica eletricamente carregada de modo controlado, para alternar entre as diferentes configurações.
Mas a realidade mostrou que ainda há uma partícula no sapato dos cientistas, embora seja uma partícula com um efeito tão interessante que vai às bases mais fundamentais da física.
Violar a Terceira Lei de Newton?
Algumas das configurações mais complexas observadas pela equipe indicam a presença de interações não recíprocas, incluindo algumas que parecem violar a terceira lei de Newton. Entre elas, destacam-se certos arranjos de partículas que começam a girar espontaneamente, ou pares de partículas que se perseguem.
Estritamente falando, a terceira lei de Newton não pode ser violada – o momento extra ganho pelas partículas é perdido para o som. Mas outras equipes já haviam feito previsões teóricas sobre a existência desses efeitos em sistemas levitados acusticamente. Só que, justamente porque as partículas sempre colapsavam em um único aglomerado, não tinha sido possível observá-los experimentalmente.
“Não se pode estudar como partículas individuais interagem quando não se consegue mantê-las separadas,” comentou o professor Scott Waitukaitis. “Ao introduzir a repulsão eletrostática, agora podemos manter estruturas estáveis e bem separadas. Isso finalmente nos dá uma plataforma controlável para investigar esses sutis efeitos não recíprocos.”
Mas Shi continua sonhando com seus cristais artificiais montados em pleno ar. “No início, era frustrante ver essas configurações híbridas, rotações estranhas e dinâmicas peculiares – elas me impediam de obter as estruturas cristalinas limpas e estáveis que eu almejava,” conta ela. “Essa é a graça dos experimentos: As descobertas mais interessantes geralmente surgem das coisas que não saem como planejado.”
Bibliografia:
Artigo: Electrostatics overcome acoustic collapse to assemble, adapt, and activate levitated matter
Autores: Sue Shi, Maximilian C. Hübl, Galien Grosjean, Carl P. Goodrich, Scott Waitukaitis
Revista: Proceedings of the National Academy of Sciences
Vol.: 122 (50) e2516865122
DOI: 10.1073/pnas.2516865122